Valores das multas por desmatamento estariam muito abaixo do esperado por causa de falhas na fiscalização, segundo especialistas
Manaus, AM - A União cobra de infratores ambientais o valor de R$ 3,8 bilhões em multas por desmatamento aplicadas pela Força-Tarefa em Defesa da Amazônia, desde setembro de 2019. As informações foram obtidas pelo projeto Data Fixers, em parceria com a agência de dados Fiquem Sabendo, via Lei de Acesso à Informação (LAI).
Os estados com maior número de processos abertos são o Pará, com 49 ações, seguido de Amazonas (48) e Mato Grosso (46). Quanto ao valor das multas acumuladas no estado, Pará também lidera, com R$ 1.477.966.079,76. Mato Grosso acumula R$ 1.269.407.821,86.
A operação é composta por membros da Procuradoria-Geral Federal e Procuradoria-Geral da União, e conta com a ajuda do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para fiscalizar e acionar possíveis infratores na região da Amazônia Legal, composta pelos estados de Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e Maranhão.
Valores subestimados
Os valores cobrados em indenizações, no entanto, deveriam ser maiores, segundo especialistas ouvidos pelo Metrópoles.
De acordo com os dados consolidados de 2021 do MapBiomas, rede de dados sobre a situação dos biomas brasileiros, disponíveis no Relatório Anual de Desmatamento no Brasil daquele ano, o percentual das áreas com alertas de possíveis desmatamentos que tiveram ação do Poder Público, seja para autorizar a destruição da natureza, seja para autuar, era de apenas 7,7%. No Pará, por exemplo, a fiscalização chegou a 4,8% dessas regiões.
André Freitas, gerente de Florestas do Greenpeace Brasil, aponta que ocorre fiscalização menor em relação aos alertas de possíveis desmatamentos no país , em especial, nessas regiões. “Esses números revelam que a quantidade de multas aplicadas é muito pouca. O que vemos corresponde a uma pequena parte”, avalia.
Tasso Azevedo, coordenador do MapBiomas, ressalta que o relatório de desmatamento aponta que 27,1% da área devastada no Brasil recebe ação do Poder Público. Nesse dado, não contam todos os alertas de possíveis desmatamentos, apenas a região “efetivamente afetada pela supressão da vegetação nativa”.
“Na melhor das hipóteses, a gente está falando de 27% da área com alguma ação. Pelo menos, a gente está falando de um valor [de multas] três vezes maior”, explica Azevedo.
O Metrópoles procurou o Ministério do Meio Ambiente e o Ibama, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem. O espaço permanece aberto para futuras manifestações.
Desmatamento em alta
De acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), somente nos estados de Acre, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Roraima e Rondônia, o desmatamento cresceu 28,7% entre 2019 e 2021. Foi um salto de 10,1 mil km² para 13 mil km² no acumulado nesse período.
O estado do Pará liderou nesses anos e chegou à região devastada de 5,23 mil km² em 2021. O Amazonas tomou o posto de segundo mais desmatado, posição que, até 2020, pertencia a Mato Grosso. No ano passado, o primeiro marcava 2,3 mil km² de desmatamento, enquanto o segundo, 2,21 mil km²
Estudo do Ipam, divulgado em 2022, alerta que a tendência é o desmatamento crescer ainda mais na Amazônia caso sejam aprovados projetos de lei que estão em discussão no Congresso. Segundo o instituto, esses textos preveem a regularização de áreas desmatadas e atividade de exploração mineral em terras indígenas Ernesto Carriço/NurPhoto via Getty Images
A destruição de florestas na Amazônia alcançou um novo e alarmante patamar durante o governo Bolsonaro. O desmatamento no bioma aumentou 56,6% entre agosto de 2018 e julho de 2021, em comparação ao mesmo período de 2016 a 2018Igo Estrela/Metrópoles
De acordo com a pesquisa do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), mais da metade (51%) do desmatamento do último triênio ocorreu em terras públicas, principalmente (83%) em locais de domínio federalIgo Estrela/Metrópoles
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Dois anos após o Dia do Fogo, as queimadas na região voltaram a quebrar recordes anuais. Em 2020, a Amazônia Legal registrou o maior índice dos últimos nove anos (150.783 focos de fogo), um valor 20% maior que no ano anterior e 18% maior que nos últimos cinco anosIgo Estrela/Metrópoles
Em 2019, Bolsonaro se envolveu em algumas polêmicas ao ser pressionado sobre as medidas para controlar a situação das queimadas na Amazônia. Na época, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgou que o mês de julho havia registrado aumento de 88% nos incêndios, em comparação com o mesmo período do ano anterior Fábio Vieira/Metrópoles
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O presidente da República questionou a veracidade das informações e chegou a afirmar que se o relatório fosse verdadeiro a floresta já estaria extinta. O diretor do instituto, Ricardo Galvão, acabou exonerado por conta da qualidade das informações divulgadas pelo órgão Ricardo Fonseca/ASCOM-MCTIC
Em 2020, na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), o chefe do Executivo voltou a criar polêmicas ao declarar que os incêndios florestais eram atribuídos a "índios e caboclos" e disse que eles aconteceram em áreas já desmatadas. Além disso, Bolsonaro alegou que o Brasil é vítima de desinformação sobre o meio ambiente Agência Brasil
Bolsonaro costuma falar com apoiadores no Palácio da Alvorada todos os dias
“O Amazonas ter passado o Mato Grosso na área desmatada é muito preocupante. A região tem pouca infraestrutura e ainda vai sofrer muito, porque é tida como ‘terra de ninguém'”, lamenta André Freitas, do Greenpeace.
“Verificamos que os governos locais fizeram projetos de desenvolvimento focados na pecuária, similar ao que o Matopiba (fronteira agrícola que corresponde aos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) foi para a agricultura”, destaca.
“Nessa região, há atividade de grileiros e é uma das últimas fronteiras agrícolas. O desmatamento no local acaba com a capacidade de a floresta reter o carbono. Além disso, essa região é muito afetada, principalmente, porque, no sul do Amazonas, há indígenas e florestas intocadas”, ressalta Freitas.
Fonte: Metrópoles
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