Ofensiva do premier para emparedar Judiciário enfraquece coesão interna e mina estabilidade regional, avaliam especialistas
Os ataques do Hamas a partir de Gaza são comuns. O que assustou os israelenses foi a tarde de quarta-feira, quando o som, que lembra o barulho de uma ambulância lenta e abafada, disparou na Galileia, norte do país, fronteira com o Líbano.
Os foguetes eram uma resposta de grupos palestinos às incursões da polícia de Israel contra o complexo da Mesquita de al-Aqsa, em Jerusalém, nesta semana, quando 350 palestinos foram presos em meio às celebrações do mês do Ramadã. Apenas na Galileia, foram 34 foguetes em meia hora, maior número desde 2006, na última guerra contra o grupo xiita libanês Hezbollah.
Os foguetes eram uma resposta de grupos palestinos às incursões da polícia de Israel contra o complexo da Mesquita de al-Aqsa, em Jerusalém, nesta semana, quando 350 palestinos foram presos em meio às celebrações do mês do Ramadã. Apenas na Galileia, foram 34 foguetes em meia hora, maior número desde 2006, na última guerra contra o grupo xiita libanês Hezbollah.
A possibilidade de um novo conflito lançou israelenses a refletirem sobre o efeito das profundas divisões internas que marcam o atual momento político do país, efeitos que vão desde ameaças à segurança nacional quanto ao frágil equilíbrio regional.
A tensão se elevou nos últimos dias. Na sexta-feira, atentados na Cisjordânia e em Tel Aviv deixaram três mortos e cinco feridos. Ontem, o ministro da Defesa, Yoav Gallant, convocou militares para reforçar a segurança nas ruas, em meio a protestos, pelo décimo quarto fim de semana consecutivo, contra a reforma do Judiciário proposta pelo governo. O Exército de Israel confirmou que três foguetes foram disparados contra o país da Síria, sem causar danos.
A fratura exposta na sociedade israelense é grave, causada pela proposta de reforma do Judiciário do premier Benjamin Netanyahu, embalada pela coalizão mais à direita da História de Israel, com dois ministros extremistas em postos-chave. Com ela, Netanyahu e seus aliados pretendem emparedar a Suprema Corte, dando ao Parlamento o direito de derrubar sentenças do tribunal, e dar maior controle ao governo sobre nomeações de juízes.
A tensão se elevou nos últimos dias. Na sexta-feira, atentados na Cisjordânia e em Tel Aviv deixaram três mortos e cinco feridos. Ontem, o ministro da Defesa, Yoav Gallant, convocou militares para reforçar a segurança nas ruas, em meio a protestos, pelo décimo quarto fim de semana consecutivo, contra a reforma do Judiciário proposta pelo governo. O Exército de Israel confirmou que três foguetes foram disparados contra o país da Síria, sem causar danos.
A fratura exposta na sociedade israelense é grave, causada pela proposta de reforma do Judiciário do premier Benjamin Netanyahu, embalada pela coalizão mais à direita da História de Israel, com dois ministros extremistas em postos-chave. Com ela, Netanyahu e seus aliados pretendem emparedar a Suprema Corte, dando ao Parlamento o direito de derrubar sentenças do tribunal, e dar maior controle ao governo sobre nomeações de juízes.
Sentindo que a democracia no país está ameaçada, desde o início do ano, os críticos da reforma vêm tomando as ruas em protestos que reúnem dezenas de milhares de pessoas, com adesão de setores importantes da sociedade, como o de alta tecnologia, reservistas da Força Aérea que se recusam a treinar, sindicatos e até membros do governo, como o ministro da Defesa, Yoav Gallant.
— Esse processo [de instabilidade interna] pode enfraquecer a coesão da sociedade israelense e diminuir sua capacidade de reagir a desafios — avalia o professor da Universidade de Tel Aviv Eran Lerman, que integrou o Conselho de Segurança Nacional de Netanyahu entre 2009 e 2016. — Igualmente perigoso é o fato de que também pode instigar nossos inimigos a pensar que estamos tão enfraquecidos internamente que eles podem assumir riscos, o que iria minar uma parte muito importante da nossa estratégia nacional, que é a dissuasão.
Os inimigos a que o professor se refere são os vizinhos Irã e Síria, assim como grupos paraestatais regionais que atuam nesses países ou são por eles apoiados: Hezbollah, Hamas e Jihad Islâmica.
A ameaça à estabilidade vai além da preocupação com países inimigos. A Jordânia, em paz com Israel desde 1994, se vê pressionada pelas políticas de membros radicais do governo israelense a favor de colonos judeus contra palestinos na Cisjordânia, já que o país tem a custódia do complexo da Mesquita de al-Aqsa.
Até EUA criticaram
Netanyahu visitou o vizinho logo no início do seu governo para tentar acalmar as tensões. Em fevereiro e março, encontrou-se novamente com líderes do país e do Egito, dos Estados Unidos e representantes palestinos, porém especialistas apontam a incongruência entre um primeiro-ministro que quer apagar incêndios enquanto seus aliados da extrema direita tentam inflamá-los.
— A composição do governo que levou à reforma do Judiciário é a mesma que levou a tensões de segurança. O fato de termos ministros de extrema direita em posições no governo, lidando com a segurança nacional, em temas relacionados a assentamentos, cria tensões com os palestinos. As mesmas pessoas estão impactando temas domésticos e a questão com os palestinos — diz Nimrod Goren, do Instituto do Oriente Médio.
O professor afirma que, antes mesmo de Joe Biden criticar a proposta da reforma do Judiciário de Netanyahu, o presidente americano já estava engajado em iniciativas voltadas para a segurança regional. Nimrod lembra outras iniciativas de promoção de estabilidade regional abandonadas pelo governo.
— Um dos pilares da estabilidade regional foi o Fórum do Negev, um mecanismo que pôs EUA, Israel, Egito, Emirados Árabes, Bahrein e Marrocos para discutir vários aspectos da cooperação regional. A cúpula deveria ter sido em março, mas foi adiada sem a marcação de nova data. A capacidade deste governo de levar adiante a cooperação em questões de segurança que acontecia antes não está acontecendo mais.
Nimrod acredita que o aumento da tensão com os EUA, países europeus e a desaceleração da cooperação com alguns países árabes também afetam o posicionamento internacional de Israel.
— Quando se juntam os tumultos internos à situação com o ministro da Defesa, isso reflete fraqueza, e essa fraqueza aliada a políticas extremistas é um manual para o escalonamento da violência — disse ele, referindo-se ao episódio em que Netanyahu demitiu o ministro Yoav Gallant por suas críticas à reforma do Judiciário, mas voltou atrás.
Há uma quarta linha de preocupação, que é como reagirão os países dos Acordos de Abraão (Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Sudão e Marrocos), que se aproximaram recentemente de Israel.
— A violência contra os palestinos na Cisjordânia, a situação no Líbano e em Gaza, tudo isso definitivamente está gerando preocupação no mundo árabe. Nesse sentido, este governo está criando problemas e, se as coisas continuarem do jeito que estão agora, os países que normalizaram recentemente as relações com Israel podem dar um passo para trás — avalia Gerald Feierstein, pesquisador sênior do Instituto para o Oriente Médio.
Já o professor Manuel Trajtenberg, diretor executivo do Instituto para Estudos de Segurança Nacional, acredita que a instabilidade política não soa bem para esses parceiros extremistas e pode mesmo impedir que mais países se juntem aos Acordos de Abraão.
— Esse processo [de instabilidade interna] pode enfraquecer a coesão da sociedade israelense e diminuir sua capacidade de reagir a desafios — avalia o professor da Universidade de Tel Aviv Eran Lerman, que integrou o Conselho de Segurança Nacional de Netanyahu entre 2009 e 2016. — Igualmente perigoso é o fato de que também pode instigar nossos inimigos a pensar que estamos tão enfraquecidos internamente que eles podem assumir riscos, o que iria minar uma parte muito importante da nossa estratégia nacional, que é a dissuasão.
Os inimigos a que o professor se refere são os vizinhos Irã e Síria, assim como grupos paraestatais regionais que atuam nesses países ou são por eles apoiados: Hezbollah, Hamas e Jihad Islâmica.
A ameaça à estabilidade vai além da preocupação com países inimigos. A Jordânia, em paz com Israel desde 1994, se vê pressionada pelas políticas de membros radicais do governo israelense a favor de colonos judeus contra palestinos na Cisjordânia, já que o país tem a custódia do complexo da Mesquita de al-Aqsa.
Até EUA criticaram
Netanyahu visitou o vizinho logo no início do seu governo para tentar acalmar as tensões. Em fevereiro e março, encontrou-se novamente com líderes do país e do Egito, dos Estados Unidos e representantes palestinos, porém especialistas apontam a incongruência entre um primeiro-ministro que quer apagar incêndios enquanto seus aliados da extrema direita tentam inflamá-los.
— A composição do governo que levou à reforma do Judiciário é a mesma que levou a tensões de segurança. O fato de termos ministros de extrema direita em posições no governo, lidando com a segurança nacional, em temas relacionados a assentamentos, cria tensões com os palestinos. As mesmas pessoas estão impactando temas domésticos e a questão com os palestinos — diz Nimrod Goren, do Instituto do Oriente Médio.
O professor afirma que, antes mesmo de Joe Biden criticar a proposta da reforma do Judiciário de Netanyahu, o presidente americano já estava engajado em iniciativas voltadas para a segurança regional. Nimrod lembra outras iniciativas de promoção de estabilidade regional abandonadas pelo governo.
— Um dos pilares da estabilidade regional foi o Fórum do Negev, um mecanismo que pôs EUA, Israel, Egito, Emirados Árabes, Bahrein e Marrocos para discutir vários aspectos da cooperação regional. A cúpula deveria ter sido em março, mas foi adiada sem a marcação de nova data. A capacidade deste governo de levar adiante a cooperação em questões de segurança que acontecia antes não está acontecendo mais.
Nimrod acredita que o aumento da tensão com os EUA, países europeus e a desaceleração da cooperação com alguns países árabes também afetam o posicionamento internacional de Israel.
— Quando se juntam os tumultos internos à situação com o ministro da Defesa, isso reflete fraqueza, e essa fraqueza aliada a políticas extremistas é um manual para o escalonamento da violência — disse ele, referindo-se ao episódio em que Netanyahu demitiu o ministro Yoav Gallant por suas críticas à reforma do Judiciário, mas voltou atrás.
Há uma quarta linha de preocupação, que é como reagirão os países dos Acordos de Abraão (Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Sudão e Marrocos), que se aproximaram recentemente de Israel.
— A violência contra os palestinos na Cisjordânia, a situação no Líbano e em Gaza, tudo isso definitivamente está gerando preocupação no mundo árabe. Nesse sentido, este governo está criando problemas e, se as coisas continuarem do jeito que estão agora, os países que normalizaram recentemente as relações com Israel podem dar um passo para trás — avalia Gerald Feierstein, pesquisador sênior do Instituto para o Oriente Médio.
Já o professor Manuel Trajtenberg, diretor executivo do Instituto para Estudos de Segurança Nacional, acredita que a instabilidade política não soa bem para esses parceiros extremistas e pode mesmo impedir que mais países se juntem aos Acordos de Abraão.
Apesar da preocupação com a política externa, Trajtenberg afirma que a principal consequência da instabilidade doméstica causada pelo novo governo de extrema direita e sua proposta de reforma do Judiciário foi trazer um novo elemento: a interferência da política em questões de segurança nacional.
— Neste momento, a maior consequência para a segurança nacional é o fato de que as divisões dentro da sociedade israelense estão entrando no Exército também. Muitos dos manifestantes pertencem a unidades do Exército, inclusive pilotos e outras unidades de elite.
Aposta nas instituições
Trajtenberg afirma que, em caso de um conflito entre uma ordem de Netanyahu e os valores das Forças Armadas, prevaleceriam a democracia e as instituições. Isso, diz, deveria afastar receio de aliados de que Israel possa fazer algo irresponsável agora que radicais integram o governo — algo que poderia preocupar os vizinhos, já que, apesar de não admitir publicamente, o país é considerado como sendo detentor de armas nucleares.
— A capacidade dos políticos de tomar uma atitude extremista [nesse sentido] é praticamente nula —afirma Trajtenberg. — A resposta é unânime entre os membros do aparato de segurança: vamos obedecer a lei.
Fonte: O GLOBO
— Neste momento, a maior consequência para a segurança nacional é o fato de que as divisões dentro da sociedade israelense estão entrando no Exército também. Muitos dos manifestantes pertencem a unidades do Exército, inclusive pilotos e outras unidades de elite.
Aposta nas instituições
Trajtenberg afirma que, em caso de um conflito entre uma ordem de Netanyahu e os valores das Forças Armadas, prevaleceriam a democracia e as instituições. Isso, diz, deveria afastar receio de aliados de que Israel possa fazer algo irresponsável agora que radicais integram o governo — algo que poderia preocupar os vizinhos, já que, apesar de não admitir publicamente, o país é considerado como sendo detentor de armas nucleares.
— A capacidade dos políticos de tomar uma atitude extremista [nesse sentido] é praticamente nula —afirma Trajtenberg. — A resposta é unânime entre os membros do aparato de segurança: vamos obedecer a lei.
Fonte: O GLOBO
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