Brasileira de 26 anos morreu após cair de prédio em Buenos Aires; autoridades argentinas apuram se foi feminicídio ou suicídio

Sangue e sêmen foram encontrados em 25 amostras colhidas de preservativos, lençóis e do espartilho que a brasileira Emmily Rodrigues, de 26 anos, usava na manhã em que morreu, após cair do sexto andar de um prédio de Buenos Aires, no bairro do Retiro, em 30 de março. 

De acordo com o jornal "La Nación", as novas descobertas da polícia local complicam a situação do dono do apartamento, o empresário argentino Francisco Sáenz Valiente, de 52 anos, investigado como suspeito de feminicídio. Ele chegou a ser preso no início de abril, mas foi solto pela Justiça do país no dia 19 do mês passado, após passar 20 dias detido pelo caso.

Sáenz Valiente disse à polícia que não teve relações sexuais com Emmily naquela manhã. No entanto, das 48 amostras analisadas, 25 deram positivo para sangue e sêmen. Para a acusação, os resultados das análises indicam que o empresário mentiu.

— Os resultados das perícias desacreditam a versão de Sáenz Valiente, que afirmou que naquela noite não teve relações sexuais com as mulheres que estiveram em seu apartamento — disse o advogado Ignacio Trimarco, que representa Arístides Da Silva Gomes e Catia Cilene Rodrigues Santos, pais de Emmily.

Trimarco anunciou que vai solicitar uma perícia genética para saber a quem pertencem as manchas de sangue encontradas no apartamento.

— Se as manchas de sangue forem compatíveis com o padrão genético de Emmily, isso provaria que a jovem foi ferida antes de cair — disse Trimarco.

Já Rafael Cúneo Libarona, um dos advogados de defesa do empresário, disse ao jornal que não se sabe "há quantos anos" o sêmen coletado no apartamento está no local.

— Não está provado que foi desde a madrugada em que Rodrigues morreu. Faltam ainda os resultados de mais de dez exames já ordenados pelo juiz e solicitados pelo Ministério Público e por esta defesa — rebateu o defensor.

Os resultados das perícias constam de relatório da Divisão de Análises Físicas, Químicas e Industriais da Superintendência de Polícia Científica da Polícia Civil e já foram incorporados aos autos. O sangue foi detectado em seis amostras: três em um lençol cor de vinho, uma em uma fronha, uma na parte externa de uma camisinha e a última, no espartilho fúcsia que Emmily usava naquela manhã. A peça foi encontrada no apartamento depois que a brasileira caiu seminua do apartamento.

Já o sêmen foi detectado em 19 amostras: oito no interior, exterior ou embalagens de preservativos, três num edredom bege, um em edredom azul, três em um lençol bordô, dois em uma fronha, um em um cotonete e outro em um toalha.

MP tenta reverter soltura de empresário

Nos próximos dias, a Justiça portenha vai analisar o recurso interposto pelo Ministério Público contra a soltura Sáenz Valiente, ainda de acordo com o "La Nación". O Ministério Público argentino tenta uma nova prisão do empresário. De acordo com a agência de notícias Telám, os promotores alegaram que a morte da jovem se deu em um "contexto sexualizado" e de "grave violência contra a mulher", e que o apartamento de Valiente teria sido alterado, dificultando as investigações.

Além disso, apontam que as evidências reunidas indicam que Valiente teria fornecido drogas a Emmily — substâncias foram identificadas no seu corpo —, para fins sexuais, e que ela pode ter sido empurrada ou caído da janela, ao tentar pedir ajuda para sair daquela situação. As investigações continuam nas mãos da polícia argentina. O GLOBO relembra os últimos capítulos e o que se sabe sobre o envolvimento do homem na morte da brasileira.

O que o empresário alega?

Sáenz Valiente nega envolvimento na morte da brasileira. Ele disse que a queda foi acidental após o que teria sido, de acordo com ele, um surto psicótico de Emmily, enquanto estava no seu apartamento. Assim, ela teria se jogado do sexto andar do prédio.

Sáenz Valiente diz ter pedido ajuda antes da morte

O empresário argentino afirma que ligou para equipes do serviço de emergência argentino antes da queda. O pai de Emmily encaminhou ao GLOBO uma gravação telefônica em que aparece o empresário fazendo a solicitação. No áudio, é possível ouvir a brasileira, ao fundo, gritar por socorro. Ao telefone, Sáenz Valiente pediu ajuda e forneceu o endereço da casa dele.

Vizinhos do empresário também ligaram para a emergência ao ouvirem os gritos de Emmily. Em uma das ligações, um homem avisa que a jovem está gritando muito e pedindo ajuda. Em outra, uma mulher diz que a vítima havia caído da janela.

Por que a Justiça argentina soltou Valiente?

Quando autorizou a soltura de Valiente, a Justiça entendeu não existir provas e nem base para manter a prisão. Os promotores recorreram da decisão, alegando ainda que o empresário deve ser processado por "feminicídio e facilitação de entorpecentes".

Um exame toxicológico indicou que a brasileira fez uso de drogas alucinógenas antes do acidente. Segundo o laudo do Laboratório de Toxicologia e Química Jurídica do Corpo Médico Legal, foram encontrados álcool, cocaína, maconha, ketamina e MDMA — um dos componentes do tusi, a forma abreviada para "Tucibi" pela pronúncia inglesa da sigla 2C-B, que é um nome da "cocaína rosa".

A família da jovem, entretanto, diz que a brasileira não usava entorpecentes e que, de acordo com áudios obtidos pela polícia, gritou por ajuda pouco antes da queda. Também confirma que vizinhos teriam ouvido a jovem desesperada pedindo socorro antes de cair no pátio interno do prédio.

Segundo o jornal argentino La Nación, para os advogados que representam a família do jovem, a presença de drogas no corpo de Emmily Rodrigues confirmariam a hipótese de que entorpecentes foram fornecidos pelo proprietário do apartamento.

Houve relações sexuais entre eles na noite da morte?

Os exames não encontraram a presença de esperma no corpo da brasileira. A investigação da polícia argentina chegou a encontrar preservativos usados no apartamento do suspeito Francisco Sáenz Valiente, que negou ter tido relações sexuais com a jovem na noite da morte.

O que foi encontrado no apartamento?

Em uma busca e apreensão de mais de 14 horas, realizada pelas autoridades argentinas no imóvel de Sáenz Valiente, no final do mês de abril, os investigadores encontraram preservativos usados e três seringas, uma delas com uma substância não identificada, segundo a Telám.

Este foi o local onde a vítima esteve pela última vez antes de morrer. As autoridades procuraram possíveis manchas de sangue, sêmen e fluidos biológicos em todos os ambientes do apartamento, incluindo o quarto do réu e sua cama de massagem. Roupas e lençóis foram recolhidos para perícia. Esta semana, a polícia confirmou que restos de sangue e sêmen foram detectados nos objetos e reforçam a hipótese de que o empresário mentiu para a polícia.

Indícios

Em 18 de maio, uma nova vistoria foi feita no apartamento, pelos desembargadores da Câmara Criminal. Eles serão responsáveis por determinar se a morte de Emmily foi um feminicídio ou um suicídio.

O advogado de Sáenz Valiente afirma ter apresentado como nova prova um áudio do seu cliente para o serviço de emergência. O canal de televisão C5N divulgou os trechos da gravação, onde é possível ouvir as palavras: "Ela escapou de mim, ela escapou de mim, ela se jogou". O advogado também afirmou que Sáenz Valiente a impediu de pular de uma janela em duas ocasiões e que ele falhou na terceira tentativa, quando quis agarrá-la e ficou com a calça da vítima na mão, e a jovem acabou caindo.

No próximo dia 22, uma audiência oral definirá se confirmam a improcedência ou se há elementos para acusá-lo por crime. O crime de feminicídio prevê prisão perpétua, enquanto o de "facilitação de entorpecentes e local para seu uso" é punível com prisão de três a 12 anos.


Fonte: O GLOBO