Anúncio do governador de expandir formato foi lido como afago aos bolsonaristas após semana de mal-estar com ex-presidente
A ampliação das escolas cívico-militares em São Paulo não estava nos planos do governador Tarcísio de Freitas até o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciar o fim do programa nacional instituído por seu antecessor, Jair Bolsonaro (PL), segundo deputados da base governista ouvidos pelo GLOBO.
Tarcísio anunciou nas redes sociais, na noite da última terça-feira, que vai editar um decreto para regular um programa estadual de escolas cívico-militares e ampliar unidades de ensino com esse formato.
Em janeiro, numa entrevista ao GLOBO, o secretário de Educação de São Paulo, Renato Feder, disse que o governo não iria “ativamente” tratar das escolas militares no primeiro ano de gestão, apenas se houvesse uma demanda “muito grande” da sociedade e da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp). Na Casa Legislativa, porém, há uma frente parlamentar dedicada ao assunto, além de propostas de deputados da base para a criação dos colégios.
Tarcísio foi questionado recentemente sobre a ampliação das escolas cívico-militares no estado em uma reunião com deputados bolsonaristas, mas desconversou, dizem pessoas que participaram da reunião. Ao ser cobrado sobre a pauta, teria respondido que o sistema cívico-militar era “limitado” e que não teria como fazê-lo “em escala”.
Procurado, o governo de São Paulo afirmou que o tema é debatido por Tarcísio desde a campanha eleitoral e que sempre teve seu apoio. Mas que viu necessidade de anunciar uma medida própria para São Paulo em razão da suspensão repentina do programa federal.
Parlamentares bolsonaristas afirmam que Tarcísio não é afeito ao programa de escolas cívico-militares, embora seja uma bandeira da direita e do governo do qual ele foi ministro. O anúncio em contraponto a Lula foi lido pelos aliados como um afago à base bolsonarista, uma tentativa de colocar panos quentes sobre a relação que ficou abalada na semana passada, quando Tarcísio saiu em defesa da Reforma Tributária, contrariando Bolsonaro.
Publicamente, a base bolsonarista evita tecer críticas ao titular do Palácio dos Bandeirantes e comemora a iniciativa do governador. Nos bastidores, porém, o anúncio foi chamado de “jogada de marketing”.
Um dos parlamentares resumiu a atitude de Tarcísio a uma imagem do rosto dele estampada em uma nota de R$ 3. Outro questionou: “Quantas escolas cívico-militares ele o secretário já inauguraram nesses sete meses de governo?”. Um terceiro disse que o governador está “jogando para a torcida”. Nenhum deles quis se identificar.
Próximos passos
Com o anúncio de Tarcísio, deputados da base do governo já se movimentam para colaborar com o futuro programa estadual de escolas cívico-militares, que só deve sair do papel a partir de 2024. O secretário da Educação Renato Feder deve fazer no próximo dia 24 a primeira reunião para tratar do projeto.
— Estou fazendo um trabalho junto à PM para que os colégios sejam viabilizados em todos os estados. Estou em conversa com várias prefeituras que manifestaram interesse — diz Lucas Bove (PL), deputado bolsonarista ligado à pauta da educação.
O deputado Tenente Coimbra (PL) foi o autor de um projeto de lei que instituía o modelo no estado e que virou lei em março de 2021, por promulgação do então governador João Doria. Mas o projeto nunca foi implementado na prática. Em outubro de 2022, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) declarou a lei inconstitucional porque um projeto como esse deveria ser proposto pelo Executivo, e não por iniciativa parlamentar.
Após a decisão do governo federal de pôr fim ao programa, Coimbra se reuniu com Tarcísio no Palácio dos Bandeirantes, antes do governador anunciar a novidade. A ideia de Tarcísio é fazer um decreto instituindo o projeto, nos moldes da norma editada por Bolsonaro em 2019, em que as escolas poderão escolher se querem ou não aderir ao modelo cívico-militar. Caso queira sugerir um projeto de lei, deputados aliados afirmam que ele não teria dificuldade de passar pela Alesp.
— Eu acho que tudo bem ser por decreto, mas se for passar pela Assembleia não tem problema, a gente tem ampla maioria. Não é um programa educacional, é administrativo. Não mexe em conteúdo programático, com os professores ou dentro de sala de aula, mas com a organização escolar, em escolas que serão voluntárias. Como é um programa organizacional, então não existe a obrigatoriedade de passar pela assembleia — avalia Coimbra.
A deputada Leticia Aguiar (PP) também se mobiliza para que seu projeto, similar ao de Coimbra, seja aprovado na Alesp e usado como base para o decreto mencionado por Tarcísio nas redes sociais. A implementação desse tipo de escola é a bandeira de seu mandato. Ela estará com o governador em uma viagem a Marília nesta sexta-feira, onde devem tratar do assunto.
O advogado Henrique Lago da Silveira, sócio da área de Educação do Mattos Filho, explica que não há impedimento para que o programa estadual de escolas cívico-militares seja criado por um simples decreto.
— Depende de como se quer estruturar o programa. O programa federal foi construído por meio de decreto porque ele é de adesão voluntária, e o ente federativo que aderisse podia indicar as escolas e as escolas participavam do programa, então neste caso pode ser instituído por decreto porque não muda o modelo de ensino regular do estado, só cria uma maneira alternativa, de adesão voluntária, de um estado ofertar a sua educação — explica.
São Paulo tem apenas uma escolas cívico-militar, no Guarujá. Com pouca adesão no estado, o modelo foi amplamente adotado no Paraná, onde Renato Feder foi secretário da Educação. Lá, há 206 colégios cívicos-militares, sendo 12 dentro do programa federal e 194 no âmbito do projeto estadual.
Rusga com a base
A necessidade de fazer um aceno à ala ideológica já vinha batendo na porta do ex-ministro de Bolsonaro há alguns meses. Na Alesp, deputados se queixam da falta de propostas que contemplem a direita e reclamam do pouco prestígio da bancada e de promessas não cumpridas, como a indicação de Altair Moraes (Republicanos) para a liderança do governo na Casa. O cargo ficou com o deputado Jorge Wilson (Republicanos), conhecido como “Xerife do Consumidor”, que não tem relação com o bloco mais radical.
Outra queixa feita reservadamente trata do abandono de aliados. Dizem os bolsonaristas que Tarcísio prometeu se movimentar para que o policial federal Danilo Campetti (Republicanos) deixasse o posto de suplente para assumir o mandato na Alesp, o que não aconteceu. Também não colocou no governo o ex-deputado estadual Frederico d'Avila.
Fonte: O GLOBO
Próximos passos
Com o anúncio de Tarcísio, deputados da base do governo já se movimentam para colaborar com o futuro programa estadual de escolas cívico-militares, que só deve sair do papel a partir de 2024. O secretário da Educação Renato Feder deve fazer no próximo dia 24 a primeira reunião para tratar do projeto.
— Estou fazendo um trabalho junto à PM para que os colégios sejam viabilizados em todos os estados. Estou em conversa com várias prefeituras que manifestaram interesse — diz Lucas Bove (PL), deputado bolsonarista ligado à pauta da educação.
O deputado Tenente Coimbra (PL) foi o autor de um projeto de lei que instituía o modelo no estado e que virou lei em março de 2021, por promulgação do então governador João Doria. Mas o projeto nunca foi implementado na prática. Em outubro de 2022, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) declarou a lei inconstitucional porque um projeto como esse deveria ser proposto pelo Executivo, e não por iniciativa parlamentar.
Após a decisão do governo federal de pôr fim ao programa, Coimbra se reuniu com Tarcísio no Palácio dos Bandeirantes, antes do governador anunciar a novidade. A ideia de Tarcísio é fazer um decreto instituindo o projeto, nos moldes da norma editada por Bolsonaro em 2019, em que as escolas poderão escolher se querem ou não aderir ao modelo cívico-militar. Caso queira sugerir um projeto de lei, deputados aliados afirmam que ele não teria dificuldade de passar pela Alesp.
— Eu acho que tudo bem ser por decreto, mas se for passar pela Assembleia não tem problema, a gente tem ampla maioria. Não é um programa educacional, é administrativo. Não mexe em conteúdo programático, com os professores ou dentro de sala de aula, mas com a organização escolar, em escolas que serão voluntárias. Como é um programa organizacional, então não existe a obrigatoriedade de passar pela assembleia — avalia Coimbra.
A deputada Leticia Aguiar (PP) também se mobiliza para que seu projeto, similar ao de Coimbra, seja aprovado na Alesp e usado como base para o decreto mencionado por Tarcísio nas redes sociais. A implementação desse tipo de escola é a bandeira de seu mandato. Ela estará com o governador em uma viagem a Marília nesta sexta-feira, onde devem tratar do assunto.
O advogado Henrique Lago da Silveira, sócio da área de Educação do Mattos Filho, explica que não há impedimento para que o programa estadual de escolas cívico-militares seja criado por um simples decreto.
— Depende de como se quer estruturar o programa. O programa federal foi construído por meio de decreto porque ele é de adesão voluntária, e o ente federativo que aderisse podia indicar as escolas e as escolas participavam do programa, então neste caso pode ser instituído por decreto porque não muda o modelo de ensino regular do estado, só cria uma maneira alternativa, de adesão voluntária, de um estado ofertar a sua educação — explica.
São Paulo tem apenas uma escolas cívico-militar, no Guarujá. Com pouca adesão no estado, o modelo foi amplamente adotado no Paraná, onde Renato Feder foi secretário da Educação. Lá, há 206 colégios cívicos-militares, sendo 12 dentro do programa federal e 194 no âmbito do projeto estadual.
Rusga com a base
A necessidade de fazer um aceno à ala ideológica já vinha batendo na porta do ex-ministro de Bolsonaro há alguns meses. Na Alesp, deputados se queixam da falta de propostas que contemplem a direita e reclamam do pouco prestígio da bancada e de promessas não cumpridas, como a indicação de Altair Moraes (Republicanos) para a liderança do governo na Casa. O cargo ficou com o deputado Jorge Wilson (Republicanos), conhecido como “Xerife do Consumidor”, que não tem relação com o bloco mais radical.
Outra queixa feita reservadamente trata do abandono de aliados. Dizem os bolsonaristas que Tarcísio prometeu se movimentar para que o policial federal Danilo Campetti (Republicanos) deixasse o posto de suplente para assumir o mandato na Alesp, o que não aconteceu. Também não colocou no governo o ex-deputado estadual Frederico d'Avila.
Fonte: O GLOBO
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