Ucranianos não assumiram responsabilidade pelo ataque, que seria o segundo desde que a guerra começou em fevereiro do ano passado
A Rússia acusou a Ucrânia de um ataque nas primeiras horas desta segunda-feira contra a ponte vital que liga a Península da Crimeia, ocupada desde 2014, ao resto do território russo. Duas pessoas morreram e parte da construção de 19,2 km sobre o Estreito de Querche teria colapsado, forçando o fechamento temporário da principal artéria usada pelos militares russos para abastecer seus soldados no sul da Ucrânia.
O Kremlin, por sua vez, se retirou formalmente do acordo mediado há um ano pela Organização das Nações Unidas que permitia a exportação de grãos ucranianos pelo Mar Negro, pondo fim a um bloqueio que fez o preço dos alimentos e a inflação global dispararem.
Os russos culparam os ucranianos pelas explosões, autoria também atribuída por veículos de notícia do país do presidente Volodymyr Zelensky, mas Kiev não assumiu abertamente a responsabilidade, recorrendo à retórica ambígua que usa de praxe nos quase 18 meses de conflito. Autoridades da Ucrânia, que deram pontapé em uma contraofensiva para retomar territórios ocupados no mês passado, dizem que a estrutura é um alvo legítimo devido ao seu papel logístico vital para os esforços de guerra russos.
Sergei Aksynov, governante pró-Rússia da Crimeia, disse que a ponte foi fechada devido a uma "emergência", enquanto Vladimir Rogov, autoridade russa no sul da Ucrânia, disse no Telegram ter havido duas explosões, uma às 3h04 (21h04 de domingo no Brasil) e outra às 3h20 (21h20 no Brasil). Viacheslav Gladkov, governador da região de Belgorod, fronteiriça com a Ucrânia, disse que um homem e uma mulher de sua região morreram devido às explosões, e sua filha de 14 está internada em estado estável.
Em um comunicado, a Chancelaria russa não descarta que o Ocidente tenha relação com o ataque contra a ponte. De acordo com o Ministério "se for revelado que drones de origem ocidental atacaram a ponte, além de um papel dos países ocidentais em planejar, patrocinar ou realizar esta operação, isso confirmará sua cumplicidade nas atividades terroristas do regime de Kiev.
Construída a um custo equivalente a US$ 3,7 bilhões e inaugurada pessoalmente por Putin em 2018, a superestrutura tem na realidade duas pontes paralelas — uma com quatro pistas para carros e outra para uma ferrovia dupla — e é a construção mais longa do tipo na Europa. Quando foi erguida, foi promovida como um troféu na anexação da Crimeia quatro anos antes, após a queda do governo pró-Moscou em Kiev. A Península, sede da Frota russa do Mar Negro, havia sido cedida à Kiev nos anos 1950, durante o período soviético.
A extensão real dos danos não foi esclarecida pelas autoridades russas, mas horas após a explosão os serviços ferroviários foram retomados e o Kremlin diz que em breve as rodovias também voltarão a funcionar. Uma situação similar ocorreu em outubro do ano passado, quando um trecho da ponte foi derrubado após a explosão do que os russos afirmaram ser um caminhão-bomba, paralisando o tráfego por algumas horas. A rodovia foi completamente reaberta em fevereiro e a ferrovia, em maio.
Vídeos compartilhados pelo site Mash, próximo à polícia russa, mostram que uma parte da ponte colapsou e outra começou a afundar nas águas do Estreito. Os investigadores afirmam terem encontrado vestígios de jet skis perto da área e afirmam que os ucranianos usaram drones explosivos submarinos para realizar seu ataque. No Telegram, circulam imagens de um carro destruído e do céu tomado pela fumaça antes do amanhecer.
Ucrânia não assume responsabilidade
Os ucranianos não negam nem confirmam, com o conselheiro de Zelensky, Mykhailo Podolyak, indo ao Twitter afirmar que "qualquer estrutura ilegal usada para a entrega de instrumentos russos de assassinato em massa terá vida necessariamente curta (...) independentemente dos motivos para a destruição". Na semana passada, a vice-ministra da Defesa, Hanna Maliar, já havia se referido a um "primeiro golpe contra a ponte da Crimeia para romper com a logística dos russos".
— Claro, quaisquer problemas logísticos são complicadores adicionais para os ocupantes, criando vantagens em potencial para as forças de defesa ucranianas — disse à imprensa local Andrii Yusov, porta-voz da agência de inteligência ucraniana, após afirmar que Kiev não comentaria sobre quaisquer ataques.
A porta-voz do Comando Sul das Forças Armadas de Kiev, Natalia Humeniuk, disse que pode se tratar de uma "provocação de Moscou", mas jornais como o Ukrainska Pravda e sites de notícia apontam as Forças Armadas de seu país como responsáveis. A agência pública de notícias Ukrinform, por sua vez, disse que drones marinhos ucranianos estão por trás do ataque, citando fontes não identificadas do Serviço Secreto ucraniano.
Se Kiev conseguir destruir ou danificar significativamente a ponte, Moscou ficaria com uma única grande rota pela costa sul da Ucrânia para mandar recursos às dezenas de milhares de soldados que lutam para manter territórios capturados nas primeiras semanas da invasão. É um caminho estreito, contudo, é mais vulneráveis a ataques ucranianos.
Ainda assim, a interrupção do tráfego vem no auge do verão boreal, e a Crimeia é um destino popular para russos que buscam destinos litorâneos sem gastar muito. Devido ao incidente, autoridades locais pediram para que as pessoas permaneçam em suas casas e hotéis e deem preferência a "rota alternativa terrestre pelas novas regiões", referindo-se ao território ocupado pela Ucrânia.
Acordo de grãos suspenso
Horas após a explosão, Moscou anunciou sua saída formal do acordo de grãos mediado pela ONU e pela Turquia há um ano, que permitiu a exportação de aproximadamente 32,9 milhões de toneladas de grãos desde agosto — mais da metade para países em desenvolvimento. Moscou reclama desde que o pacto foi selado que a enxurrada de sanções ocidentais impostas para tentar minar a capacidade russa de financiar a guerra impedem um pacto paralelo para permitir pagamentos, seguros e transporte para os grãos russos.
Segundo Peskov, o Kremlin retornará ao pacto, que tinha esta segunda como prazo final para ser renovado, "assim que os acordos agrícolas relevantes forem cumpridos". Mais tarde, em um comunicado, a Chancelaria russa disse que cogitará a volta ao pacto caso veja "resultados concretos" ao invés de "garantias".
"Apenas após o recebimento de resultados concretos, e não promessas e garantias, a Rússia estará pronta para considerar restaurar o acordo", diz a nota.
O impasse acentua o risco de uma nova disparada do preço global dos alimentos, catalisador de uma crise inflacionária que afetou grande parte do planeta e aumentou a insegurança alimentar para os mais pobres. Após o anúncio russo, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que se encontrou com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva às margens da cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) e da União Europeia (UE), tuitou:
"Eu condeno veementemente a manobra cínica da Rússia de terminar a Iniciativa de Grãos do Mar Negro, apesar dos esforços da ONU e da Turquia", escreveu ela. "A UE está trabalhando para garantir segurança alimentar para os mais vulneráveis."
A repórteres, o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, disse acreditar que Putin quer a continuação do acordo. Ele prometeu trazer o assunto à tona durante uma reunião que os dois deverão ter no mês que vem:
— Espero que com esta conversa possamos obter algum progresso e continuar a seguir nosso caminho sem uma pausa — disse ele.
Na semana passada, o secretário-geral da ONU, António Guterres, enviou a Putin uma carta com propostas buscando atender às condições da Rússia para uma extensão do pacto. Negociadores das Nações Unidas e da Turquia passaram o fim da semana esperando uma resposta de Moscou, e nos dias que antecederam o término do acordo, as exportações de grãos nos portos ucranianos haviam caído para perto de zero.
Um raro exemplo de negociações frutíferas entre as partes em conflito, o único acordo entre russos e ucranianos nesta guerra aliviou com sucesso a escassez global de grãos. Ambos países estão entre os maiores exportadores de alimentos e respondem por 30% do comércio global de trigo.
Pelo pacto, os navios tinham permissão para passar com segurança por embarcações de guerra russas que bloqueam os portos do Mar Negro desde o início da invasão. Os navios são inspecionados na costa de Istambul, em parte para garantir que não estejam carregando armas, uma pré-condição para que o pacto fosse selado.
Fonte: O GLOBO
Os russos culparam os ucranianos pelas explosões, autoria também atribuída por veículos de notícia do país do presidente Volodymyr Zelensky, mas Kiev não assumiu abertamente a responsabilidade, recorrendo à retórica ambígua que usa de praxe nos quase 18 meses de conflito. Autoridades da Ucrânia, que deram pontapé em uma contraofensiva para retomar territórios ocupados no mês passado, dizem que a estrutura é um alvo legítimo devido ao seu papel logístico vital para os esforços de guerra russos.
Sergei Aksynov, governante pró-Rússia da Crimeia, disse que a ponte foi fechada devido a uma "emergência", enquanto Vladimir Rogov, autoridade russa no sul da Ucrânia, disse no Telegram ter havido duas explosões, uma às 3h04 (21h04 de domingo no Brasil) e outra às 3h20 (21h20 no Brasil). Viacheslav Gladkov, governador da região de Belgorod, fronteiriça com a Ucrânia, disse que um homem e uma mulher de sua região morreram devido às explosões, e sua filha de 14 está internada em estado estável.
Em um comunicado, a Chancelaria russa não descarta que o Ocidente tenha relação com o ataque contra a ponte. De acordo com o Ministério "se for revelado que drones de origem ocidental atacaram a ponte, além de um papel dos países ocidentais em planejar, patrocinar ou realizar esta operação, isso confirmará sua cumplicidade nas atividades terroristas do regime de Kiev.
Construída a um custo equivalente a US$ 3,7 bilhões e inaugurada pessoalmente por Putin em 2018, a superestrutura tem na realidade duas pontes paralelas — uma com quatro pistas para carros e outra para uma ferrovia dupla — e é a construção mais longa do tipo na Europa. Quando foi erguida, foi promovida como um troféu na anexação da Crimeia quatro anos antes, após a queda do governo pró-Moscou em Kiev. A Península, sede da Frota russa do Mar Negro, havia sido cedida à Kiev nos anos 1950, durante o período soviético.
A extensão real dos danos não foi esclarecida pelas autoridades russas, mas horas após a explosão os serviços ferroviários foram retomados e o Kremlin diz que em breve as rodovias também voltarão a funcionar. Uma situação similar ocorreu em outubro do ano passado, quando um trecho da ponte foi derrubado após a explosão do que os russos afirmaram ser um caminhão-bomba, paralisando o tráfego por algumas horas. A rodovia foi completamente reaberta em fevereiro e a ferrovia, em maio.
Vídeos compartilhados pelo site Mash, próximo à polícia russa, mostram que uma parte da ponte colapsou e outra começou a afundar nas águas do Estreito. Os investigadores afirmam terem encontrado vestígios de jet skis perto da área e afirmam que os ucranianos usaram drones explosivos submarinos para realizar seu ataque. No Telegram, circulam imagens de um carro destruído e do céu tomado pela fumaça antes do amanhecer.
Ucrânia não assume responsabilidade
Os ucranianos não negam nem confirmam, com o conselheiro de Zelensky, Mykhailo Podolyak, indo ao Twitter afirmar que "qualquer estrutura ilegal usada para a entrega de instrumentos russos de assassinato em massa terá vida necessariamente curta (...) independentemente dos motivos para a destruição". Na semana passada, a vice-ministra da Defesa, Hanna Maliar, já havia se referido a um "primeiro golpe contra a ponte da Crimeia para romper com a logística dos russos".
— Claro, quaisquer problemas logísticos são complicadores adicionais para os ocupantes, criando vantagens em potencial para as forças de defesa ucranianas — disse à imprensa local Andrii Yusov, porta-voz da agência de inteligência ucraniana, após afirmar que Kiev não comentaria sobre quaisquer ataques.
A porta-voz do Comando Sul das Forças Armadas de Kiev, Natalia Humeniuk, disse que pode se tratar de uma "provocação de Moscou", mas jornais como o Ukrainska Pravda e sites de notícia apontam as Forças Armadas de seu país como responsáveis. A agência pública de notícias Ukrinform, por sua vez, disse que drones marinhos ucranianos estão por trás do ataque, citando fontes não identificadas do Serviço Secreto ucraniano.
Se Kiev conseguir destruir ou danificar significativamente a ponte, Moscou ficaria com uma única grande rota pela costa sul da Ucrânia para mandar recursos às dezenas de milhares de soldados que lutam para manter territórios capturados nas primeiras semanas da invasão. É um caminho estreito, contudo, é mais vulneráveis a ataques ucranianos.
Ainda assim, a interrupção do tráfego vem no auge do verão boreal, e a Crimeia é um destino popular para russos que buscam destinos litorâneos sem gastar muito. Devido ao incidente, autoridades locais pediram para que as pessoas permaneçam em suas casas e hotéis e deem preferência a "rota alternativa terrestre pelas novas regiões", referindo-se ao território ocupado pela Ucrânia.
Acordo de grãos suspenso
Horas após a explosão, Moscou anunciou sua saída formal do acordo de grãos mediado pela ONU e pela Turquia há um ano, que permitiu a exportação de aproximadamente 32,9 milhões de toneladas de grãos desde agosto — mais da metade para países em desenvolvimento. Moscou reclama desde que o pacto foi selado que a enxurrada de sanções ocidentais impostas para tentar minar a capacidade russa de financiar a guerra impedem um pacto paralelo para permitir pagamentos, seguros e transporte para os grãos russos.
Segundo Peskov, o Kremlin retornará ao pacto, que tinha esta segunda como prazo final para ser renovado, "assim que os acordos agrícolas relevantes forem cumpridos". Mais tarde, em um comunicado, a Chancelaria russa disse que cogitará a volta ao pacto caso veja "resultados concretos" ao invés de "garantias".
"Apenas após o recebimento de resultados concretos, e não promessas e garantias, a Rússia estará pronta para considerar restaurar o acordo", diz a nota.
O impasse acentua o risco de uma nova disparada do preço global dos alimentos, catalisador de uma crise inflacionária que afetou grande parte do planeta e aumentou a insegurança alimentar para os mais pobres. Após o anúncio russo, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que se encontrou com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva às margens da cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) e da União Europeia (UE), tuitou:
"Eu condeno veementemente a manobra cínica da Rússia de terminar a Iniciativa de Grãos do Mar Negro, apesar dos esforços da ONU e da Turquia", escreveu ela. "A UE está trabalhando para garantir segurança alimentar para os mais vulneráveis."
A repórteres, o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, disse acreditar que Putin quer a continuação do acordo. Ele prometeu trazer o assunto à tona durante uma reunião que os dois deverão ter no mês que vem:
— Espero que com esta conversa possamos obter algum progresso e continuar a seguir nosso caminho sem uma pausa — disse ele.
Na semana passada, o secretário-geral da ONU, António Guterres, enviou a Putin uma carta com propostas buscando atender às condições da Rússia para uma extensão do pacto. Negociadores das Nações Unidas e da Turquia passaram o fim da semana esperando uma resposta de Moscou, e nos dias que antecederam o término do acordo, as exportações de grãos nos portos ucranianos haviam caído para perto de zero.
Um raro exemplo de negociações frutíferas entre as partes em conflito, o único acordo entre russos e ucranianos nesta guerra aliviou com sucesso a escassez global de grãos. Ambos países estão entre os maiores exportadores de alimentos e respondem por 30% do comércio global de trigo.
Pelo pacto, os navios tinham permissão para passar com segurança por embarcações de guerra russas que bloqueam os portos do Mar Negro desde o início da invasão. Os navios são inspecionados na costa de Istambul, em parte para garantir que não estejam carregando armas, uma pré-condição para que o pacto fosse selado.
Fonte: O GLOBO
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