Banco Central reduziu juros pela segunda vez seguida. Analistas recomendam de títulos do Tesouro a CDBs atrelados à inflação. Títulos de crédito privado são alternativa

Até pouco tempo, com a taxa básica de juros (Selic) nas alturas, o investidor vinha conseguindo no Brasil um retorno de mais de 1% ao mês em papéis de renda fixa, sem se preocupar com riscos. Com o início do ciclo de corte de juros, no entanto, surge a necessidade de reavaliar os investimentos. Pode ser a hora de buscar oportunidades mais rentáveis, mas que embutem um pouco mais de risco.

Após a última redução de 0,5 ponto percentual na Selic, anunciada pelo Banco Central do Brasil nesta quarta-feira, que levou a taxa para 12,75% ao ano, especialistas sugerem aumentar a exposição a ativos vinculados à inflação e recorrer ao crédito privado -- os títulos de dívida emitidos por empresas.

Isso porque é esperado que, daqui em diante, títulos pós-fixados, como o Tesouro Selic, paguem prêmios cada vez menores, visto que o mercado projeta a taxa de juros a 11,75% ao ano em dezembro e a 9% no fim de 2024.

Esse tipo de aplicação, que garante liquidez diária, não deve ser abandonada completamente, advertem os especialistas. Isso porque é por ser uma ótima ferramenta para guardar recursos da reserva de emergência — dinheiro que pode ser usado para imprevistos, como consertar o carro quebrado ou pagar uma consulta médica em caso de necessidade.

Segredo é diversificar, diz analista

Na fatia reservada para objetivos de médio e longo prazo, o segredo é diversificar. Pra quem não considera investimentos mais sofisticados como fundos multimercados e ações e prefere ficar na renda fixa, o economista e assessor da RJ + Investimentos, Bruno Monsanto, recomenda títulos de emissão bancária como certificados de depósito bancário (CDBs), letras de crédito imobiliário ou agrícola (LCIs e LCAs) que ofereçam retorno em torno de 11% para um período de dois anos, e de crédito bancário, como debêntures, certificados de recebíveis imobiliários ou do agronegócio (CRIs e CRAs).

Em um momento em que o mercado tem sido constantemente surpreendido por pedidos de recuperação judicial de empresas, como as de Americanas e Light, porém, é necessário fazer uma análise criteriosa dos ativos.

— Escolha uma empresa triplo A, que é a medida para avaliar a robustez da companhia, e prefira investimentos com fluxo de pagamento de juros e amortizações. Não concentre todo os seus recursos num mesmo emissor, nem em um único setor. Por fim, analise a saúde financeira da empresa — aconselha Monsanto.

Papéis ligados ao IPCA são atraentes

O economista ainda indica aumentar a exposição a ativos relacionados à inflação, como os Tesouro IPCA+, como uma forma de proteção da carteira:

— Nunca abra mão de títulos atrelados à inflação em ciclos de corte de juros. Um título que paga a inflação é como nadar de boia. Se a maré subir, você sobe junto. Já um título pré-fixado é uma âncora.

Embora as aplicações prefixadas não estejam pagando retornos tão expressivos como antes, de cerca de 15% ao ano, o planejador financeiro do C6 Bank, Rafael Haddad, acredita que ainda há espaço para esse investimento na carteira. Na hora de escolher, é indicado optar por ativos que paguem não menos que 11% no ano e que não tenham prazos de vencimento tão longos.

Esses critérios são importantes porque há um risco embutido. Se o cenário macroeconômico projetado se realizar, o investidor terá garantido uma boa rentabilidade. Mas, se a taxa de juros voltar a subir, ele poderá ficar com o dinheiro preso em uma aplicação que passa a não ser mais tão vantajosa.

Para além disso, Haddad acredita que os investidores devam aumentar a alocação em investimentos atrelados à inflação:

— Enquanto estamos cortando juros no Brasil, os Estados Unidos ainda podem aumentar a taxa por lá. A redução da diferença entre as taxas brasileira e americana pode gerar fluxo para o dólar, o que pode pressionar o preço de combustíveis e produtos que importamos. Assim, a inflação sobe. Por isso, ativos relacionados ao IPCA podem ser boas opções de retorno e proteção.

Renda fixa ainda gera bons retornos

Mesmo que a renda variável (os investimentos em ações na Bolsa, por exemplo) comece a apresentar boas oportunidades nos próximos meses, Camilla Dolle, head de Renda Fixa da XP, diz que não é necessário reduzir a alocação em ativos de renda fixa, já que esses continuam oferecendo bons retornos com a taxa Selic ainda em dois dígitos e a inflação mais controlada.

Na sua opinião, para obter melhores rendimentos, os investidores devem diminuir a exposição em títulos pós-fixados e aumentar em ativos relacionados ao IPCA.

— Ainda há ótimos retornos na renda fixa, tanto em crédito privado, quanto em títulos públicos. A curva de juros reflete expectativa ainda elevada para os juros de longo prazo, por volta de 10% a 11% — acrescenta. — E quando a gente fala de crédito privado, por exemplo, a gente está falando dos prêmios de risco de crédito, que continuam mais altos que os prêmios que a gente tinha no início do ano. Eles não se recuperaram 100% da crise de crédito do primeiro semestre. Inclusive, bons pagadores também oferecem taxas interessantes.

Busca por papéis de renda fixa segue em alta

Um levantamento do Santander mostrou que, no Rio de Janeiro, os aportes em CDBs, LCI, LCA e LIGs cresceram 20% na instituição. Já o interesse por Tesouro Direto e fundos de renda fixa recuou 8% e 13%, respectivamente.

Diante da perspectiva de manutenção ou alta da taxa de juros americana nas próximas reuniões, Leonardo Siqueira, head de Investimentos do Santander Brasil, aponta a renda fixa do exterior como mais uma alternativa para aumentar os ganhos.

— A gente tem identificado oportunidades nas letras, LCI e LCA, e fundos de infraestrutura, CRI, CRA. Um outro produto que tem tido bom desempenho são fundos de renda fixa global.


Fonte: O GLOBO