Mineral é usado em baterias para veículos e já conta com 16 projetos de exploração em Chile, Argentina, Brasil e Bolívia. Vale do Jequitinhonha (MG) atrai investimento bilionário
Com o avanço da eletrificação da frota global de veículos, a América do Sul desponta como líder no fornecimento de lítio, mineral essencial para as baterias. Levantamento da KPMG mostra que há 16 projetos de exploração da matéria-prima em Chile, Argentina, Brasil e Bolívia. As montadoras já iniciaram uma corrida para garantir o produto, já que mais de 74% do lítio explorado no mundo são usados na fabricação de baterias.
— Chile, Argentina e Brasil formam o triângulo do lítio, com 60% das reservas globais. É uma nova fronteira do mineral com reservas já comprovadas — diz Manuel Fernandes, sócio de Energia e Recursos Naturais da KPMG na América do Sul, que lembra que a Bolívia tem grandes reservas, mas ainda não explora de forma consistente.
As vendas de veículos elétricos saltaram de 3,3 milhões em 2019 para 6,6 milhões no mundo todo no ano passado, o que provocou uma escalada no preço do lítio e uma disputa pelas jazidas. A chinesa BYD, que vai investir R$ 3 bilhões na Bahia em três unidades fabris, vai processar lítio e ferro fosfato em uma dessas fábricas.
A montadora já produz baterias no Brasil em uma planta em Manaus. A companhia tem planos de investir em lítio no país, associando-se com parceiros. Nessa disputa pela eletrificação, a BYD, segundo analistas, tem a vantagem de deter a produção de baterias, fabricar placas solares para captar energia limpa, além de fazer o beneficiamento do lítio.
É o que se chama de verticalização da produção de veículos elétricos, observa Antônio Jorge Martins, coordenador de cursos automotivos da FGV.
Disputa entre UE e China
O presidente para a América Latina da Stellantis, Antônio Filosa, grupo que tem as marcas Fiat, Jeep, Peugeot e Citröen, disse que o lítio é parte do plano estratégico da companhia, pelo qual a montadora prevê atingir 100% de participação de veículos elétricos no mix de vendas de carros de passeio na Europa e de 50% no mix de carros de passeio e comerciais leves nos EUA até 2030.
No Brasil, no mesmo período, a empresa quer ter 20% de veículos eletrificados. A montadora investe na exploração de cobre na Argentina, material usado em chips.
— Regionalmente, a América do Sul, além do Brasil, apresenta enorme potencial de produção de algumas matérias-primas, com destaque para Argentina, Chile e Bolívia — disse.
A Volks vê o lítio como componente essencial para a eletrificação de veículos também no Brasil. A estratégia da montadora, chamada “Way to Zero” — com meta se se tornar carbono neutro até 2050 —, prevê parcerias e pesquisas para encontrar tecnologias cada vez mais sustentáveis.
Unidade da Sigma no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, vai produzir 270 mil toneladas de concentrado de lítio por ano, mais que o dobro da produção nacional de 2021 — Foto: Divulgação/Sigma
O executivo de uma empresa do setor, que prefere não se identificar, diz que nos bastidores há disputa feroz entre montadoras americanas e europeias com as chinesas para verticalizar a produção de elétricos.
O lance mais recente dessa guerra foi o pedido da União Europeia para investigar subsídios do governo chinês à produção de veículos elétricos. E, segundo o mesmo executivo, todas as montadoras estão em busca da matéria-prima, embora não revelem planos, além de desenvolverem fábricas de baterias para não ficarem dependentes dos chineses.
EUA emprestam para Ford
A Ford vai receber empréstimo de US$ 9,2 bilhões (R$ 43,9 bilhões) do Departamento de Energia dos EUA para a construção de três fábricas de baterias veiculares no país. A Hyundai vai investir US$ 5 bilhões numa joint venture com a SK On, unidade de baterias da SK Innovation, para erguer fábrica no estado da Georgia. A General Motors se uniu à Samsung, com investimentos de US$ 3 bilhões, para ter sua fábrica de baterias com altor teor de níquel, nos EUA.
Segundo se especula no mercado, a Tesla, fabricante de carros elétricos de Elon Musk, estaria interessada em comprar a mineradora canadense Sigma, incluindo a operação brasileira. Em nota, o Conselho de Administração da Sigma confirmou que recebeu diversas propostas, mas não revela os interessados nem se a venda avança. A operação brasileira da Sigma, em Minas Gerais, é a única fora do Canadá e é estratégica.
Tesla teria interesse em comprar a Sigma, mineradora canadense que tem planta em Minas Gerais, segundo especulação de mercado — Foto: Bloomberg
Vale do lítio
Só com a mineração, os investimentos estimados até 2030 para a produção do lítio são calculados em R$ 15 bilhões pelo Ministério de Minas e Energia (MME). O Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, desponta como polo produtor no Brasil. O governo mineiro lançou na Nasdaq, a Bolsa das empresas de tecnologia, o projeto Vale do Lítio, para atrair investimentos à região, a mais pobre do estado. O objetivo é que os recursos tragam impacto econômico e desenvolvimento.
— Nossa expectativa é de criação de ao menos 10 mil empregos, diretos e indiretos, e investimentos de R$ 20 bilhões a R$ 30 bilhões até 2030 — diz a secretária-adjunta de Desenvolvimento de Minas, Kathleen Garcia.
A Sigma desenvolve o projeto Grota do Cirilo na região, investiu R$ 3 bilhões e gerou mil empregos diretos e 6.500 indiretos em Araçuaí e Itinga. Em julho, a empresa exportou o primeiro carregamento do “lítio verde” produzido com zero emissão de carbono, zero rejeito e sem uso de químicos nocivos. A australiana Latin Resources Limited levantou R$ 600 milhões para investir no projeto Salinas Lithium, também em Minas. A operação deve começar em 2025 e gerar 300 empregos.
A canadense Lithium Ionic anunciou investimento de R$ 750 milhões e geração de mil empregos. A americana Atlas Lithium detém 57 direitos minerários em Araçuaí, Itinga, Coronel Murta, Rubelita, Taiobeiras e Virgem da Lapa para explorar minério na região. E a Companhia Brasileira de Lítio (CBL) produz 40 mil toneladas por ano, dois terços disso exportados para países como a China. Todos os projetos são no Vale do Jequitinhonha.
O MME elabora programa multissetorial e específico para a região e trabalha para atrair investidores.
Fonte: O GLOBO
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