Pesquisa aponta que pessoas com o objetivo de perder peso podem estar treinando em intensidades inadequadas

A melhor frequência cardíaca para queimar gordura varia de pessoa para pessoa e, muitas vezes, está fora da “zona de queima de gordura” estipulada em tabelas fixadas em aparelhos de exercício físico, como esteiras ergométricas. É o que aponta um estudo recente publicado na revista Nutrition, Metabolism and Cardiovascular Disease, feito por pesquisadores da Escola de Medicina Icahn do Monte Sinai, nos EUA.

As tabelas indicam, normalmente, que a queima máxima de gordura ocorre em atividades que necessitem do uso de 60% a 75% da frequência cardíaca máxima. Mas o novo trabalho mostra que pode haver uma diferença média de 23 batimentos por minuto entre a faixa indicada nas tabelas e a frequência cardíaca individual ideal para queimar gordura.

Toda atividade física promove um nível de oxidação de gordura — o que chamamos popularmente de queima. Quando iniciamos uma atividade, nosso corpo começa a usar tanto a glicose disponível no sangue quanto a gordura (em forma de ácido graxo) como combustível. Conforme a intensidade do exercício vai aumentando, o uso de glicose e ácido graxo também se eleva, até que chega a uma intensidade em que a queima de gordura é máxima e grande parte da sua energia provém dela. Esse é o conceito de FATmax (fat, de gordura, e max, de máximo, ambos no inglês).

“Pessoas com objetivo de perda de peso ou gordura podem estar interessadas em se exercitar na intensidade que permite a taxa máxima de queima de gordura. A maioria das máquinas de exercícios comerciais oferece uma opção de ‘zona de queima de gordura’, dependendo da idade, sexo e coração taxa”, disse a autora principal do estudo Hannah Kittrell, em comunicado. “No entanto, a zona de queima de gordura normalmente recomendada não foi validada, portanto, os indivíduos podem estar se exercitando em intensidades que não estão alinhadas com seus objetivos personalizados de perda de peso”.

No estudo, os pesquisadores compararam a frequência cardíaca na zona de FATmax, medida durante um teste de exercício clínico, com a frequência cardíaca prevista em porcentagens de esforço máximo dentro da “zona de queima de gordura” normalmente recomendada.

Numa amostra de 26 voluntários, os cientistas descobriram que frequência cardíaca prevista nas tabelas e a que foi medida no exame clínico e apontava a zona de FATmax real estavam distantes, com uma diferença média de 23 batimentos por minuto entre as duas medidas. Isto sugere que as recomendações gerais para uma “zona de queima de gordura” podem não fornecer uma orientação precisa.

Intensidade x queima

Muitas pessoas acreditam que quanto mais intenso for o exercício físico, mais gordura elas vão queimar. Correr parece mais “emagrecedor” do que caminhar, não é mesmo?

No entanto, quando a intensidade do exercício ultrapassa a zona de FATmax, o corpo entende que precisa de muito mais energia para continuar realizando aquela atividade e prioriza o uso de glicose, cuja transformação em combustível é menos complexa que a de ácidos graxos. Assim o uso de gordura despenca.

Mas fazer uma atividade física mais intensa não significa, no entanto, que você não está queimando gordura nenhuma.

— As pessoas podem cair na pegadinha de achar que se fizerem menos esforço vão emagrecer menos. Mas não. No entanto, o raciocínio é um pouco mais complexo — declara Luciana Haddad, médica livre docente pela USP que tem um canal no Youtube (Fala Lu), onde publica vídeos sobre saúde, esporte e qualidade de vida. — Quando você queima muita glicose, essa energia saiu de algum lugar, seja da sua alimentação do dia anterior ou do café da manhã. Quando tudo isso acabar você vai começar a queimar gordura e até a “quebrar” músculos conseguir energia e prosseguir no exercício. Portanto, uma atividade de alta intensidade vai sim queimar gordura, mas a um custo metabólico diferente.

A médica pondera que, para a maioria da população, praticar exercícios na intensidade da zona do FATmax seria o ideal, já que a pessoa já estaria queimando o máximo de gordura possível sem a necessidade de “roubar” energia de outras estruturas do corpo.

“Esperamos que este trabalho inspire mais indivíduos e treinadores a utilizar testes de exercício clínico para prescrever rotinas de exercícios personalizadas, adaptadas à perda de gordura. Ele também enfatiza o papel que as abordagens baseadas em dados podem ter no exercício de precisão”, afirmou o autor sênior Girish Nadkarni, em comunicado.

Benefícios

Ter uma faixa de FATmax mais alta, ou seja, ter o máximo de queima de gordura com um nível de atividade física em intensidade mais elevada é muito bom porque o corpo leva mais tempo para trocar a prioridade pela gordura do sangue pela glicose disponível. No caso de atletas de que fazem provas de longa distância, como maratonas e triatlo, é fundamental.

— Para esse atleta é bom porque ele não vai conseguir ter o aporte de carboidrato suficiente ao longo prova, então parte da energia será proveniente da gordura. E quanto maior o FATmax, melhor é a utilização dessa gordura — explica Haddad.

Mas não apenas os atletas de alto rendimento se beneficiam de um FATmax alto. Pessoas comuns também. Uma das vantagens, por exemplo, é poder treinar em jejum com mais segurança. Como o corpo vai usar, por mais tempo, a gordura disponível no sangue, há um menor risco de passar mal.

Segundo a médica, as duas melhores formas de aumentar o FATmax é melhorando a capacidade aeróbica e diminuindo a ingesta de carboidratos antes dos treinos.

— É preciso diminuir a ingesta de carboidratos progressivamente, pois se ocorrer de forma abrupta, como ir treinar em jejum de um dia para o outro, a pessoa pode passar mal. Conforme a pessoa vai dando esses dois passos, a faixa de FATmax vai mudando.


Fonte: O GLOBO