Grupo vai aguardar abertura de fronteira em prédio na cidade de Khan Younes, mais longe da área que Israel deu ultimato para ser esvaziada

O grupo de brasileiros que estava alojado em uma escola católica na Faixa de Gaza chegou, na manhã deste sábado, à cidade de Khan Younes, ao sul da região, após o ultimato das forças israelenses para que a área fosse esvaziada. A informação foi confirmada às 8h25 (horário de Brasília) pelo embaixador Alessandro Candeas, chefe do Escritório de Representação do Brasil em Ramala, na Cisjordânia. 

As autoridades avaliam que os brasileiros ficarão mais seguros na cidade do sul, em meios aos preparativos do Exército israelense para um possível incursão terrestre após a ofensiva terrorista deflagrada pelo Hamas, no último sábado.

A Embaixada do Brasil em Tel Aviv transmitiu às Forças de Defesa de Israel informação sobre o edifício onde estão hospedados os brasileiros em Khan Younes, para não serem bombardeados.

Com clima semiárido, Khan Younes costuma ter temperaturas elevadas durante o dia e mais frescas à noite. A temperatura média anual é de 22ºC, sendo janeiro o mês mais quente. A cidade é considerada a maior das províncias de Gaza em área e tem aproximadamente 230 mil habitantes, de acordo com o site do poder local. Apesar disso, cidadãos sofrem com problemas de infraestrutura e acesso a serviços.

Mapa mostra locais atacados por terroristas do Hamas — Foto: Reprodução/NYT

A economia de Khan Younes é movida principalmente pelo comércio, com proteção de caravanas e ponto de descanso para comerciantes. A região é famosa pelo "mercado de quarta-feira", que reúne centenas de compradores e vendedores num mesmo local do Centro em todo meio de semana. Mas a cidade é também reserva de água e cesta básica das províncias de Gaza. 

Com diversas fazendas, é lar de cidadãos que atuam na agricultura e na pecuária. Entre as principais culturas agrícolas do local estão grãos como trigo e cevada, vegetais e frutas como goiaba, melancia e melão.

Enquanto isso, a indústria é pouco desenvolvida, com destaque para produções não tão sofisticadas de pães e doces e negócios nos segmentos de tecidos, ferraria e carpintaria. Segundo o poder local, existem dezenas de escolas de ensino público vinculadas à Agência das Nações Unidas de Assistência e Obras para Refugiados e ao setor privado, além de várias universidades, como a Universidade Islâmica, a Universidade Al-Aqsa, a Universidade Aberta Al-Quds e a Universidade da Palestina.

Em 1948, foi estabelecido o Campo de Refugiados de Khan Younes, que abriga milhares de cidadãos que fugiram ou abandonaram suas residências a partir da guerra que resultou na criação do Estado de Israel.

Deslocamento após tensão

O deslocamento dos cidadãos brasileiros para Khan Younes começou a ser preparado na madrugada deste sábado e chegou a ser suspenso após o recebimento de "informações preocupantes". Segundo Candeas, os brasileiros ficarão abrigados na cidade até receberem o aval para cruzar a fronteira do Egito, pela passagem de Rafah.

Candeas conta que as autoridades brasileiras também comunicaram as forças de defesa de Israel sobre o ônibus, o trajeto, placa, lista de passageiros, para evitar que o coletivo fosse bombardeado e pudesse cruzar Gaza em segurança.

— O plano hoje de manhã era ir para Rafa, para a fronteira. Enfim, ir de lá, cruzar a fronteira, ir para o Egito, etc. Estava tudo pronto para isso, mas meia hora antes do deslocamento, que deveria se iniciar às 12h, às 11h30, nós recebemos a informação de que tudo isso havia sido cancelado, ou seja, a [passagem pela] fronteira foi cancelada. Havia a ideia de um comboio internacional. Além do nosso ônibus, outros ônibus iriam também juntos com outros funcionários internacionais. Tudo isso foi cancelado por Israel, e a fronteira foi novamente fechada — afirma o embaixador.

O diplomata ressalta que a mudança deixou os brasileiros "aflitos" dentro da escola católica em que estavam abrigados. Além disso, chegaram informações de que um prédio vizinho seria bombardeado, o que alavancou a tensão.

— A decisão foi retirar o nosso pessoal da escola e, como havíamos pensado ontem, colocá-los nessa cidade chamada Khan Younes, que fica a pouco mais de 10 km da fronteira, onde eles aguardarão que a fronteira seja reaberta. É muito mais seguro esperar em Khan Younes do que em Gaza. 

Eles vão ficar com uma família brasileira que tem um prédio, que vai colocar à disposição desses brasileiros que estão chegando da cidade de Gaza. Alguma acomodação de forma ainda muito precária, muito simples, mas nas circunstâncias da guerra é a melhor opção — ressaltou Candeas.

O embaixador aponta que os brasileiros vão aguardar na cidade a abertura da fronteira, o que pode ocorrer neste domingo ou na segunda-feira. Segundo Candeas, a ideia é que o grupo, ao menos, fique longe das hostilidades ao norte de Gaza, que devem se intensificar nas próximas horas após o ultimato de Israel para esvaziamento da região.

Fotos divulgadas pelo Escritório de Representação do Brasil em Ramallah, na Cisjordânia, mostraram adultos e crianças colocando os pertences no coletivo enquanto aguardavam o sinal verde para seguir viagem até o sul da região, após a ordem de evacuação do norte estabelecida pelas forças israelenses. Elas precisaram deixar o ônibus e retornar à escola antes de as autoridades analisarem as informações e darem aval para uma segunda tentativa.

Os ônibus chegaram à escola ainda na noite desta sexta, no horário local. No entanto, os brasileiros adiaram a saída da escola para garantir que o trajeto seria feito em segurança, sem bombardeios pelo caminho. A embaixada aguarda, na manhã deste sábado, um sinal verde das autoridades para deslocar o grupo.

"28 pessoas, das quais 22 brasileiros, 3 imigrantes palestinos e 3 familiares palestinos. Do total de 22 pessoas que desejam evacuação, 14 são crianças, 8 são mulheres e 6 são homens adultos. Do total de 22 pessoas que desejam evacuação, 16 se encontram na escola e 12 fora da escola. Os 12 que se encontram fora da escola estão na cidade de Khan Younes, sul da Faixa. Na escola na cidade de Gaza estão 19 brasileiros, sendo 11 crianças, 5 mulheres e 3 homens adultos", afirma a embaixada.

Brasileiros aguardam liberação para deixarem norte da Faixa de Gaza — Foto: Divulgação

O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, disse nesta sexta-feira que o governo do Egito aceitou receber os brasileiros que estão na Faixa de Gaza em saída pela fronteira, ao sul do enclave. Segundo ele, a expectativa é que os brasileiros possam cruzar o local neste sábado.

— (Os brasileiros) sairiam neste ônibus, que os transportará amanhã [sábado]. E, o que nós propusemos, é que saíssem e fossem levados para um aeroporto, uma localidade muito próxima da fronteira, onde um avião da Força Aérea Brasileira estará esperando.

O chanceler brasileiro falou sobre o assunto após reunião do Conselho de Segurança da ONU, que terminou sem acordo para aprovação de resolução ou comunicado.

— A ideia do governo é de retirá-los o mais rápido possível (de Gaza) e embarcá-los o mais rápido possível (em avião da Força Aérea Brasileira) — acrescentou Mauro Vieira.

Desde quinta-feira, o governo brasileiro intensificou o esforço diplomático para tentar repatriar os brasileiros. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, bem como Mauro Vieira e o Assessor Especial da Presidência, Celso Amorim, buscaram interlocução junto a egípcios e israelenses para que os brasileiros saiam em segurança de Gaza.

— Na reunião [do conselho] foi feito um chamamento de todos os países para que [o ultimato de Israel aos habitantes de Gaza] não seja implementado dessa forma, sobretudo com um espaço tão curto de tempo para que 1 milhão de pessoas saiam. Seria uma corrida para a morte. Todos os países fizeram um apelo para que houvesse um prazo maior — acrescentou o chanceler.

De acordo com o Itamaraty, o Escritório de Representação do Brasil em Ramala "identificou cerca de 20 brasileiros", na sua maioria mulheres e crianças, interessados em sua retirada da Faixa de Gaza. Parte deles permanece reunida em escola local, aguardando evacuação para o sul. A Embaixada em Tel Aviv solicitou formalmente ao Governo de Israel que não bombardeie a escola.

A outra parte do grupo estaria, segundo informação do ministério, no Sul da Faixa de Gaza, para onde muitas pessoas se deslocam após o alerta de evacuação emitido pelas forças de Israel.

O Brasil contratou veículos para transporte dos brasileiros até a fronteira egípcia tão logo seja possível a passagem por Rafah, de acordo com o governo.

Operação de repatriação

Até o momento, as aeronaves da Força Aérea Brasileira (FAB) envolvidas na operação de repatriação transportaram 494 brasileiros. Todos estavam em Israel e retornaram em segurança ao Brasil.

A aeronave VC-2, cedida pela Presidência da República, com capacidade para 40 pessoas, está em Roma, onde espera autorização para seguir para o Egito e resgatar os brasileiros que devem sair de Gaza.


Fonte: O GLOBO