Para banco estatal, hoje sob comando do Centrão, OSX tenta se proteger ‘sob o guarda-chuva’ da recuperação judicial ‘ de forma desesperada’

A Caixa Econômica Federal está contestando na Justiça a suspensão da cobrança de dívidas da OSX, empresa de estaleiros fundada por Eike Batista no auge do Grupo X. O banco estatal é o principal credor da companhia do ex-bilionário, que tenta na Justiça sua segunda recuperação judicial.

A suspensão das dívidas foi concedida em caráter liminar no último dia 1º pela 3ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. O juiz Paulo Assed atendeu a um pedido feito pela própria OSX ao receber uma cobrança de R$ 400 milhões da Prumo, que controla o Porto do Açu, no litoral norte do Rio.

Pelo acerto entre as duas companhias, feito na primeira recuperação judicial, a OSX aluga duas áreas da Prumo e subloca essas áreas a operadores do porto, com a condição de usar o dinheiro dos aluguéis para abater suas dívidas.

As cobranças estavam suspensas desde 2018 por meio de um acordo entre as duas empresas que vinha sendo renovado automaticamente. Mas, em 13 de outubro, a Prumo decidiu sustá-lo e cobrar as dívidas estimadas em R$ 400 milhões, alegando que a OSX jamais pagou qualquer valor pelo uso da área do Porto de Açu.

Em sua liminar, o juiz deu 60 dias para que seja realizada uma mediação entre as duas empresas. Mas a Caixa, que é principal credora da OSX, tenta derrubar essa liminar.

Em sua manifestação, a defesa da Caixa classifica a empresa de Eike como “zumbi” e sustenta que a OSX tem feito uso de mecanismos como acordos de standstill – que suspendem temporariamente a cobrança de dívidas – e a própria recuperação judicial de forma “abusiva” e “desesperada” para protelar o pagamento aos credores.

"Deste modo, o que se evidencia é que as Requerentes sobrevivem na economia como verdadeiras ‘empresas zumbis’, mediante concessão de carências para pagamento de parcelas devidas, tutelas de urgência, standstill e agora a tutela antecedente concedida no presente feito para endereçar nova recuperação judicial, sem efetivamente nada pagar desde o ano de 2013, caracterizando um completo desserviço à economia, ao mercado de crédito e à prospecção de negócios da área”.

Para os advogados, como ainda há um recurso contra o encerramento da primeira RJ, em 2020, o processo ainda não terminou, e por isso não seria possível iniciar nem uma nova recuperação judicial e nem uma arbitragem quanto às dívidas, como pediu a OSX.

Nos autos, o banco também questiona a competência da 3ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro para julgar o pedido de recuperação judicial da OSX. A Caixa sustenta que, ao direcionar o pedido de liminar para a Vara em questão, a empresa de Eike violou o princípio do juiz natural.

A 3ª Vara ainda não se manifestou quanto ao pedido da Caixa. Para o banco, o caixa da empresa de Eike não deixa dúvidas de que não se trata de um caso de RJ, mas de falência.

“Por outro lado, se a empresa que busca o soerguimento econômico financeiro está há mais de 10 (dez) anos tentando se proteger sob o guarda-chuva da Recuperação Judicial e fazendo uso de quase R$ 1 milhão mensais justificando que necessita de forma desesperada destes recursos para pagar sua estrutura e que sem esses recursos não poderá sobreviver, é de saltar aos olhos que se está diante de uma falência e não de uma Recuperação Judicial, na medida em que não existe mais o que recuperar”, alegou o banco.

Procurada pela equipe do blog, a OSX afirmou que a dívida junto à Caixa deriva de um financiamento para a construção do complexo do Porto de Açu, do qual a Prumo “é a grande beneficiária”. A empresa de Eike frisou que a atual gestão tem trabalhado para ampliar sua receita e propôs à Prumo a quitação dos valores devidos em maio de 2024 e que a sugestão teria sido ignorada pela empresa.

O posicionamento incisivo da Caixa sugere que, desta vez, o governo Lula e o Centrão – que indicou o atual dirigente do banco, Carlos Vieira – não pretendem ir ao socorro das empresas de Eike, que receberam bilhões em isenções fiscais e investimentos do BNDES durante as gestões petistas.

Criada para construir sondas e plataformas para as petroleiras brasileiras, principalmente a OGX de Eike Batista, a OSX atualmente é a única empresa do Grupo X que continua sob o controle do ex-bilionário e tem uma única fonte de receitas: o aluguel de um terreno no Porto de Açu, gerenciado pela Prumo.

A empresa decidiu no último dia 19 não renovar o acordo de standstill firmado em 2018 com a companhia do ex-bilionário – o que, na prática, abriu caminho para a cobrança das dívidas pelos demais credores.

No pedido encaminhado à Justiça no mês passado, a empresa de Eike se disse surpreendida pela decisão da Prumo e manifestou preocupação com o efeito dominó. Na petição, a OSX argumentou que a cobrança das dívidas beneficiaria apenas a empresa do Porto de Açu, o que prejudicaria as demais companhias às quais deve quantias multimilionárias – além da Caixa, estão na lista de credores o Santander, o Banco Votorantim e a Porto de Açu Operações S.A.

Já a Caixa Econômica deixou claro à Justiça que pensa diferente.

“Segundo alegado na petição inicial, as Requerentes [OSX] sustentam que fariam jus a novo pedido de recuperação, porquanto estaria preenchido o requisito temporal para endereçamento de novo pedido e, como é costumeiro em feitos recuperacionais, justificam a necessidade da medida extrema em dificuldades de caixa evidenciadas atribuindo a responsabilidade por suas agruras financeiras a terceiros e nunca a si próprias”, afirma a defesa da Caixa.

“Não se pode admitir que uma empresa, com sinais tão graves e evidências de insolvência, se utilize de forma tão abusiva do instituto da recuperação judicial, cujo propósito é preservar a economia nacional (…) como faz o Grupo OSX, que trata o instituto como veículo de moratória negocial”, prossegue a equipe de defesa.

Nos bastidores, a apreensão entre credores é grande e se estende há meses em meio ao crescimento das despesas da companhia para além das receitas.

Em 2020, quando houve a sentença de encerramento da recuperação judicial da OSX, as receitas eram de R$ 11 milhões e as despesas administrativas, de R$ 26 milhões. No primeiro trimestre de 2023, segundo as demonstrações financeiras da própria empresa, as receitas anualizadas estavam em R$ 40 milhões e as despesas, R$ 52 milhões.

Uma parte considerável dessa cifra é destinada à remuneração de pessoal e advogados. Credores ouvidos pela equipe do blog no início do mês relataram o temor de que Eike esteja “sangrando” o caixa da OSX sob o beneplácito do acordo de standstill com a Prumo e, agora, mira mais uma RJ para manter as coisas como estão.


Fonte: O GLOBO