Diante do aumento no número de casos de doenças respiratórias no país, Pequim mostra preocupação de blindar-se contra críticas como a que sofreu em 2020
O governo chinês respondeu rapidamente ao pedido da Organização Mundial da Saúde (OMS) para que fornecesse informações sobre o aumento no número de casos de doenças respiratórias no país. Isso mostra a preocupação de Pequim de blindar-se contra críticas como a que sofreu em 2020. Segundo as autoridades chinesas, não foram detectados patógenos “novos ou incomuns”, ou seja, nenhum sinal de um vírus do tipo que apareceu no país há quase quatro anos, causando a pandemia de Covid-19.
O resto é história, e cada habitante do planeta lembrará da pandemia de acordo com o país em que estava e as medidas tomadas para combatê-la. Na China, mais ou menos nesta época do ano em 2019, começaram a surgir relatos de pacientes com dificuldades respiratórias na cidade de Wuhan, levantando a suspeita de médicos locais de que um novo vírus estava circulando. Mas os primeiros alertas foram reprimidos e o governo levaria semanas até decretar o lockdown em Wuhan, enquanto o vírus já se espalhava pelo mundo.
A partir dali o governo chinês se mobilizou em duas frentes: a primeira, conter a propagação do vírus no país, algo que foi obtido com enorme sucesso nos dois primeiros anos, até que os custos da política de Covid zero superaram os benefícios e ela foi abolida em dezembro de 2022. A segunda frente foi política, para rebater a versão de que a Covid-19 teve origem na China e se espalhou pelo mundo por negligência das autoridades do país.
O tema virou duelo diplomático da China com os EUA e seus aliados. Após defender uma investigação internacional para descobrir a origem do vírus, a Austrália passou a sofrer retaliações comerciais, com uma disparada nas tarifas de importação de vários de seus produtos para a China. A politização do vírus tornou impossível a colaboração internacional necessária para que as análises seguissem adiante em Wuhan. Um time da OMS chegou a ir à cidade em 2021, mas obteve acesso restrito.
Desde então, o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, tem repetido o apelo às autoridades chinesas para que sejam transparentes e forneçam mais dados nos esforços para determinar a origem da Covid-19. Enquanto aumenta a esperança de que a pandemia chegou ao fim, disse Ghebreyesus, a questão sobre como ela começou “continua sem resposta”. Apesar de resistir a uma inspeção independente no país sobre o tema e acusar o Ocidente de politizar a Covid-19, o governo chinês sentiu a pressão internacional para que seja mais transparente, acelerando a resposta sobre o surto atual.
Mais importante ainda para Pequim, a transparência em assuntos de saúde é uma demanda doméstica que não pode ser ignorada. Os exageros intervencionistas cometidos na política de Covid zero desgastaram a imagem do governo entre muitos chineses. Isso tem afetado a recuperação da economia, pois num quadro de incerteza caem os investimentos e o consumo. Poucos achavam que a ressaca da pandemia seria tão prolongada. O surto recente de doenças respiratórias também parece ser ainda um efeito do isolamento vivido pelo país.
Para François Balloux, diretor do Instituto de Genética da Universidade College London, a China provavelmente vive essa onda de infecções respiratórias em crianças porque este é o primeiro inverno depois de um longo período de isolamento, em que deve ter havido uma drástica queda na circulação de vírus respiratórios, consequentemente diminuindo a imunidade. É um fenômeno típico de situações pós-lockdown, conhecido como “déficit de imunidade”, explicou.
Fonte: O GLOBO
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