Julieta Hernández estava no Brasil há 8 anos. Ela fazia parte de um grupo de cicloviajantes e pedalava por diversos estados do país fazendo apresentações circenses.

Um crime com requintes de crueldade. Foi desta forma que o juiz Laossy Amorim, da Comarca de Presidente Figueiredo, descreveu o assassinato da artista venezuelana Julieta Ines Hernández Martinez, de 38 anos. Ela que se definia nas redes sociais como migrante nômade, palhaça e cicloviajante, tinha o Amazonas como rota para chegar até a Venezuela, mas foi roubada, estuprada e teve o corpo queimado antes de ser morta no interior do estado.

Segundo a Polícia Civil, toda essa brutalidade foi cometida por Thiago Agles da Silva e de Deliomara dos Anjos Santos, que confessaram o crime e tiveram a prisão preventiva decretada pela justiça. O casal vivia de favor no refúgio onde Julieta se hospedou.

Thiago e Deliomara devem responder por latrocínio, estupro e ocultação de cadáver, segundo o delegado responsável pelo caso.

Julieta estava no Brasil há 8 anos. Ela fazia parte grupo do "Pé Vermêi" e pedalava por diversos estados do país fazendo apresentações circenses.

A preocupação de amigos de Julieta, que vivem no Brasil, foi fundamental para polícia solucionar o caso. Eles perceberam que a artista venezuelana deixou de mandar notícias e registraram um Boletim de Ocorrência (BO) relatando o desaparecimento dela. Entenda mais abaixo.

O desaparecimento e investigações


Artista venezuelana desaparecida — Foto: Divulgação/redes sociais

Julieta estava desaparecida desde o dia 23 de dezembro do ano passado, e o Boletim de Ocorrência (BO) foi registrado na quinta-feira (4) na Delegacia Virtual do Amazonas (Devir), e encaminhado à 37ª Delegacia Interativa de Polícia (DIP) de Presidente Figueiredo, cidade onde aconteceu o crime, que iniciou as investigações.

O BO informava que o último contato da vítima com a família teria sido no dia 23 de dezembro, por volta de meia-noite e meia, quando ela teria dito que iria pernoitar em Presidente Figueiredo, e seguiria para Rorainópolis, em Roraima.

“Diante dessa informação, nós nos deslocamos até as pousadas da região, a fim de obter notícias sobre o paradeiro dela. Já na manhã de sexta, fomos até o refúgio e localizamos Thiago, que disse que a mulher havia pernoitado no local e seguido para a rodovia”, relatou o delegado Valdinei Silva.

De acordo com o delegado, no mesmo dia, um morador localizou partes da bicicleta da vítima e acionou a polícia. Quando a equipe chegou ao local, Thiago tentou fugir, mas foi capturado. Ele e a esposa foram conduzidos à delegacia e entraram em contradição nos depoimentos, e assim confirmaram a autoria do crime.

O que os suspeitos disseram em depoimento

Conforme a polícia, Deliomara confessou que matou a venezuelana, após uma crise de ciúmes. Isso, porque ela prenunciou o companheiro estuprando a vítima depois deles roubarem os pertences dela.

Thiago contou uma versão diferente à polícia. De acordo com o suspeito, a venezuelana e ele usavam drogas, quando a companheira ficou com ciúme, jogou álcool nos dois e ateou fogo.

Ele disse ainda que apagou o fogo do corpo e chegou a procurar um hospital em busca de socorro. No entanto, enquanto isso, a esposa amarrou uma corda no corpo de Julieta, que estava desacordada, arrastou a vítima para uma área de mata e a enterrou.

Como Julieta foi morta



Julieta Hernández, desapareceu enquanto pedalava pelo interior do Amazonas. — Foto: Reprodução/Redes Sociais

Depois das contradições apresentadas pelos suspeitos, a polícia chegou em uma conclusão de como a artista foi atacada e apresentou a versão em coletiva de imprensa nesta segunda (8).

“A vítima estava dormindo em uma rede na varanda do local, quando Thiago pegou uma faca e foi até ela para roubar seu aparelho celular. Eles entraram em luta corporal, ele a enforcou, a jogou no chão e pediu que Deliomara amarrasse os pés dela. Em seguida, ele a arrastou para dentro da casa, pediu que a esposa apagasse as luzes e passou a abusar sexualmente da vítima”, detalhou o delegado.

Após a mulher do suspeito presenciar o fato, jogou álcool em ambos e ateou fogo. Thiago conseguiu apagar o fogo com um pano molhado e foi até uma unidade hospitalar receber atendimentos médicos. Já Deliomara enforcou Julieta com uma corda e a enterrou no quintal.

O resgate do corpo e identificação


Cães auxiliram nas buscas pelo corpo — Foto: Divulgação/CBMAM

O corpo de Julieta foi encontrado na sexta (5) enterrado em uma área de mata de Presidente Figueiredo. A polícia precisou solicitar apoio dos Bombeiros com os cães farejadores que deram apoio às buscas e localizou o cadáver em uma cova no quintal do refúgio, além de outros pertences da vítima.

A identificação do corpo foi realizada por meio do procedimento de necropapiloscopia, pelo Instituto de Identificação Aderson Conceição de Melo (IIACM) com apoio da equipe técnica do Instituto Médico Legal do Amazonas (IML).

Qual era o destino de Julieta

De acordo com os amigos, Julieta havia decidido que faria o percurso de retorno à Venezuela. "Seu destino final dessa viagem era o colo da mãe, no país dela de origem, e estava tão pertinho. Elas desejavam tanto esse encontro", disse Guadalupe Merki.

Julieta viajou pedalando desde o Rio de Janeiro, passando por cidades do Maranhão e Pará, até chegar ao Amazonas. Do estado, ela seguiria de bicicleta para Roraima, via BR-174. Presidente Figueiredo, município onde ela foi morta, é cortado pela rodovia.

Em um vídeo divulgado nas redes sociais, ela aparece pedalando pela avenida Torquato Tapajós, uma via de acesso à cidade de Manaus através das rodovias AM-010 e BR-174. Na gravação, a cicloviajante relata brevemente alguns trajetos que fez pelo Brasil.


Bicicleta e pertences da venezuelana encontrados no interior do Amazonas. — Foto: Francisco Carioca, da Rede Amazônica.

Mobilização dos amigos

O grupo artístico que Julieta participava divulgou o desaparecimento dela em redes sociais e após receberem informações desencontradas buscaram recursos para chegarem ao Amazonas, onde acompanharam as investigações.

Manifestação


Ato em memória da venezuelana Julieta Hernández no Largo de São Sebastião em Manaus — Foto: Divulgação/Circo Caboclo

No sábado (6), movimento sociais, artistas e amigos da venezuelana fizeram um protesto, em Manaus. Indignados com a brutalidade do crime, eles ocuparam um dos símbolos do turismo no estado, o Largo de São Sebastião, que fica diante do Teatro Amazonas, e chamaram a atenção das autoridades para o caso.

O ato em memória da venezuelana na capital amazonense foi convocado pelas redes sociais e organizado coletivamente por artistas, grupos de teatro, circo e artes cênicas. Além de membros de centros culturais e movimentos sociais participaram da ação denominada "Para Sempre #JulietaPresente".

"Perdemos uma amiga, mas sobretudo uma mulher", disse Jady Castro, amiga da vítima.

Fonte: G1