Comitê de Política Monetária (Copom) apontou que cenário internacional está mais incerto e que a inflação de serviços está sendo pressionada pelo mercado de trabalho

O Banco Central divulgou na manhã desta terça-feira a Ata do Copom relativa à reunião da semana passada, quando cortou a Taxa Selic de 11,75% para 11,25%. No texto, o BC manteve a indicação de que cortará a Selic em meio ponto nas próximas duas reuniões. Com isso, os juros cairão para 10,25% já em maio.

"Em se confirmando o cenário esperado, os membros do Comitê, unanimemente, anteveem redução de mesma magnitude nas próximas reuniões e avaliam que esse é o ritmo apropriado para manter a política monetária contracionista necessária para o processo desinflacionário", disse o Banco Central na ata.

O texto é o mesmo que já havia sido divulgado no comunicado da última quarta-feira.

Segundo a ata divulgada hoje, o cenário internacional está mais desafiador, com pressões inflacionárias globais. Além disso, o BC pontuou que a inflação de serviços no Brasil demonstra "resiliência", em grande parte em função da queda do desemprego e do aumento dos salários.

"O Comitê ressalta que, em seus cenários para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma maior persistência das pressões inflacionárias globais; e (ii) uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais apertado."

Por outro lado, o BC aponta que uma desaceleração mais forte da economia mundial e os efeitos da alta dos juros podem contribuir positivamente para a queda mais rápida da inflação.

"Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada; e (ii) os impactos do aperto monetário sincronizado sobre a desinflação global se mostrarem mais fortes do que o esperado."

Mercado de trabalho

O Copom entende que a economia brasileira está em desaceleração, em linha com o cenário traçado pelo Banco. Nos próximos meses, no entanto, os diretores do Banco Central avaliam que pode ocorrer uma "atenuação" da desaceleração da atividade, em grande parte em função do aumento da renda das famílias, como reflexo do bom momento do mercado de trabalho e as políticas de transferência de renda do governo federal:

"No que se refere à atividade econômica doméstica, prossegue o cenário de desaceleração da atividade antecipado pelo Comitê. No entanto, na discussão, apresentaram-se elementos que permitiriam observar, nos próximos meses, uma atenuação da desaceleração da atividade antecipada em função do aumento da renda das famílias, como reflexo da elevação do salário-mínimo, de benefícios sociais e do mercado de trabalho mais resiliente."

Especialmente o mercado de trabalho será monitorado pelo Banco. A taxa de desemprego em queda e os aumentos salariais serão analisados para se entender melhor os seus efeitos sobre a inflação:

"O Comitê seguirá atento à dinâmica dos rendimentos nas diversas pesquisas para melhor avaliar o grau de ociosidade no mercado de trabalho e seus potenciais impactos sobre a inflação de serviços."

Sem 'relação mecânica' com juros nos EUA

O Banco Central fez uma longa análise sobre a situação da economia internacional. Na visão dos integrantes do Copom, o ambiente está mais volátil, com tensões geopolíticas e impactos sobre o preço dos fretes, e o início do processo de redução dos juros por várias economias avançadas, a principal delas, os Estados Unidos. O BC pontuou, no entanto, que não existe "relação mecânica" entre o início do corte de juros nos EUA e uma possível aceleração dos cortes da Selic por aqui:

"O Comitê relembra que não há relação mecânica entre a condução da política monetária norte-americana e a determinação da taxa básica de juros doméstica e que, como usual, o Comitê focará nos mecanismos de transmissão da conjuntura externa sobre a dinâmica inflacionária interna."

Com esse cenário externo mais desafiados, o BC pontuou que economias emergentes como a do Brasil precisam adotar postura de cautela.

"Nesse contexto, e diante da volatilidade recente e da incerteza à frente no cenário internacional, o Comitê manteve a avaliação de que é apropriado adotar uma postura de cautela, principalmente em países emergentes."

Inflação em queda

A inflação oficial do país fechou 2023 com alta acumulada de 4,62%, dentro do intervalo da meta, que era de 3,25%, com tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo.

As projeções de inflação do mercado financeiro estão em 3,81% para 2024 e em 3,5% em 2025 e 2026. A meta é de 3%, com intervalo de 1,5 ponto. Embora esteja na tolerância, os números se mantêm acima do centro, por isso, o BC tem receio de acelerar o ritmo de cortes para 0,75 ponto, como deseja o governo Lula e integrantes da equipe econômica.

Outro ponto de preocupação do Banco Central é o aumento do crédito "direcionado" que tem taxas de juros mais baixas. Sem citar especificamente o BNDES, há uma preocupação, segundo economistas, de que essas linhas mais baratas diminuam os efeitos da política monetária. O BC também reafirmou a importância de se seguir com a disciplina fiscal.

"O Comitê reforçou a visão de que o esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal, o aumento de crédito direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos deletérios sobre a potência da política monetária e, consequentemente, sobre o custo de desinflação em termos de atividade.

A reunião foi a primeira com quatro indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Os novos diretores que participaram pela primeira vez foram Paulo Picchetti e Rodrigo Teixeira, que assumiram seus cargos no dia 2 deste mês. Os indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no BC agora são quatro (considerando Gabriel Galípolo e Ailton de Aquino Santos), de um total de nove membros da diretoria (o que inclui o presidente Roberto Campos Neto).


Fonte: O GLOBO