Oposição reclama de acesso à verba, que ficou no centro de uma crise entre o governo e o Legislativo em 2023
Para especialistas, embora haja distinções em relação ao orçamento secreto, extinto por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF), ainda existe opacidade no emprego desse tipo de verba. Após o fim do mecanismo, houve expansão das emendas de comissão. Na segunda-feira, O GLOBO mostrou que não há a identificação dos padrinhos das indicações dos recursos para as bases.
Essa modalidade, que não é de execução obrigatória, alcançou R$ 6,8 bilhões no ano passado. Para 2024, o Orçamento aprovado pelo Congresso previa R$ 16,6 bilhões. O presidente Lula vetou R$ 5,6 bilhões, deixando R$ 11 bilhões disponíveis. O corte deu início ao mais novo capítulo de tensão entre os Poderes.
No caso do PL, principal sigla de oposição, O GLOBO identificou apenas dois deputados, entre 96, contemplados: João Bacelar (PL-BA) e Ícaro de Valmir (PL-SE). Ambos, entretanto, estão entre os deputados da legenda que mais votaram com o governo.
Acompanhe o crescimento das emendas de comissão — Foto: Editoria de Arte
Líder da bancada na Câmara, Altineu Côrtes (RJ) afirmou que, no caso da sigla, foram beneficiados os parlamentares que têm um bom relacionamento com o Palácio do Planalto, o que, segundo ele, gera desigualdades:
— Nosso partido é de oposição, mas alguns deputados têm relação com o governo, como o Bacelar, por exemplo. Ele trabalhou e deve ter conseguido o recurso.
No mesmo partido, a deputada federal Rosana Valle (SP) tentou incluir, por meio da Comissão de Viação e Transportes, recursos para a Baixada Santista, seu reduto eleitoral. A iniciativa não prosperou:
— Nas reuniões, pudemos indicar o que nós acharíamos que poderia ser feito com os recursos da comissão. Não fui contemplada, e disseram que foi feito um acordo de líderes e que seriam acatadas só ações de âmbito nacional.
O GLOBO apurou que, em outros partidos, foi realizada uma divisão pelos líderes. No PSD, parlamentares afirmaram sob reserva que cada um teve direito a indicar R$ 2 milhões em emendas de comissão. A falta de acesso, entretanto, irritou outra ala do Congresso. Parlamentares lembraram ainda de um acordo feito entre Legislativo e Executivo que previa que deputados novatos poderiam indicar recursos. No final de 2023, o Partido Novo acionou o STF questionando a legalidade das emendas de comissão.
— Estamos falando do mesmo mecanismo do orçamento secreto. Agora com outra roupagem, mas com os mesmos problemas: transparência zero, ausência de critérios objetivos, sem vinculação a políticas públicas, concentração do poder e barganha nas mãos de poucos e aquele eterno balcão de negócios. Fere a isonomia entre parlamentares — disse a deputada Adriana Ventura (Novo-SP).
Compensação
De acordo com o cientista político e professor do Insper Leandro Consentino, a prática guarda semelhanças com o orçamento secreto.
— As emendas de comissão já eram previstas há tempos, mas pouco utilizadas e deram um grande salto justamente na esteira da decisão do STF proibindo as emendas de relator. Ambas têm problemas de transparência, embora eu ache que as de relator eram mais perniciosas— afirma.
Professora da Fundação Getulio Vargas (FGV), a cientista política Graziella Testa também considera que, apesar das semelhanças, as emendas de comissão são menos danosas:
— Existe uma descentralização na tomada de decisão, porque as emendas de relator centralizavam essa prerrogativa na mão do relator, enquanto as emendas de comissão têm isso descentralizado entre as comissões permanentes das duas Casas (Câmara e Senado).
Fonte: O GLOBO
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