Proposta favorece entes com maior capacidade de pagamento e que não têm feito os ajustes necessários nas suas contas

A proposta de renegociação das dívidas dos estados com o governo federal ainda não foi feita concretamente, será objeto de um projeto de Lei. Mas essa é mais uma das muitas renegociações. É uma história longa, cheia de equívocos, que tem apenas uma constância: toda vez que se renegocia, quem se beneficia são os grandes devedores, e os grandes devedores são os maiores estados, que têm, portanto, maior capacidade de pagamento. 

O governo ontem se reuniu com os estados do Sul e do Sudeste, que devem R$ 740 bilhões. E entre os estados do Sul e Sudeste 90% são do saldo devedor está concentrado nos quatro maiores estados: São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais.

A proposta apresentada pelo governo federal ontem inovou ao relacionar a redução dos juros da dívida ao aumento de matrículas em ensino técnico. Eles serão menores para quem cumprir a meta de inclusão no ensino médio técnico. Parece positiva num primeiro momento, mas o fato é que os estados precisam fazer o seu dever de casa independentemente de estímulo federal.

Os estados com as maiores dívidas são liderados por governadores que defendem a austeridade fiscal, se dizem liberais, ainda que com tendências políticas diferentes, PSDB no Rio Grande do Sul; Republicanos em São Paulo. Apesar de defenderem a bandeira da austeridade para o governo federal, na prática eles mesmo não têm implementado os ajustes necessários nas suas contas internas.

Obviamente, há diferenças entre cada um dos estados e suas políticas fiscais. Em Minas Gerais, por exemplo, Romeu Zema, do Partido Novo, tem sido pior. Entrou na Justiça e suspendeu o pagamento da dívida, mas não aproveitou esse período para fazer ajustes. Entrou no Regime de Recuperação Fiscal, mas ainda não tem um plano. 

A gestão fiscal do estado não é boa, porque Zema nada fez pelo ajuste, mas culpa a dívida com o governo federal pelos desajustes nas contas do estado. O senador Rodrigo Pacheco apresentou uma proposta de renegociação da dívida mineira que previa que a Cemig fosse entregue ao governo federal como parte do pagamento, mas não ficou claro como isso será tratado no projeto.

Essa história da dívida dos estados com o governo federal, aliás, remonta há quase 30 anos. Logo depois do Plano Real, os estados estavam muito endividados, com empréstimos feitos diretamente no mercado, que tiveram a rolagem dificultada após a estabilização. 

A solução encontrada à época pelo governo Fernando Henrique Cardoso foi federalizar essas dívidas, o que significa dizer que o estado que devia ao mercado, passou a dever ao governo federal, que fez um projeto de pagamento desse montante. E de lá pra cá, muitas renegociações já foram feitas.

Agora o que eles querem, mais uma vez, é reduzir a dívida. Mas olhando para o passado, o que se vê é que essas renegociações acabam estimulando a falta de austeridade com as finanças públicas.


Fonte: O GLOBO