Na esteira da crise da marca no Brasil, que entrou em recuperação judicial, concorrentes aderem a novidades, como milkshake de café, para conquistar público jovem que era fã da rede

Muito mais do que café, a Starbucks conquistou o coração de gerações de clientes vendendo uma experiência. Seja nos Estados Unidos, no Brasil ou no Japão, o ritual nas lojas é o mesmo. O consumidor escolhe a sua bebida, indica se quer personalizar os ingredientes, substituindo o leite de vaca pelo vegetal por exemplo, e informa o nome pelo qual será chamado na entrega do pedido.

O charme não está apenas em consumir uma bebida que reflete o american way of life, mas também em exibir um copo personalizado com o próprio nome, que rende muitos cliques aesthetic (termo usado pela geração Z para traduzir o que é agradável ao olhar) nas redes sociais.

Do ano passado para cá — quando a marca anunciou o fechamento de mais de 40 lojas no Brasil e a sua operadora no país, a SouthRock Capital, entrou com pedido de recuperação judicial por aqui —, a concorrência se atentou para uma janela de oportunidade.

Tanto grandes redes de fast-food, quanto gelaterias artesanais decidiram apostar no lançamento de frapuccinos e milkshakes de café ou de outras bebidas geladas semelhantes às vendidas pela Starbucks.

O McDonalds, que vem ampliando a sua linha de café da manhã nos últimos meses, lançou no fim de fevereiro o McShake Café, uma bebida gelada que combina sorvete de baunilha e café expresso, vendida por R$ 15,90.

Outras novidades anunciadas foram o Affogato e o Affogato Crunch do McDonald’s, todos feitos com café selecionado com grãos de origem nacional e 100% arábica. E o produto, claro, vem com o nome do cliente estampado no copo.

A mesma estratégia tem sido adotada pela Havana. Camila Akutsu, gerente-geral de Marketing da companhia, diz que, desde que a marca chegou ao Brasil, tem cardápio de bebidas geladas, como Alfajor Au Café, Cappuccino Helado, Milk Shake e outros.

Havanna escreve nome de clientes em copo de bebida, assim como Starbucks — Foto: Divulgação

No entanto, agora, com foco no público jovem, irá lançar seis sabores da linha Vannaccino: três versões com base de café expresso gelado e três com base de creme, nos sabores de morango e doce de leite, chocolate e doce de leite e somente doce de leite.

As novidades instagramáveis vão estar disponíveis em todas as lojas do país até 31 de março, com preço promocional de R$ 14,90.

— A Havanna constantemente trabalha em novas propostas de consumo para seus clientes. Anualmente, são uma média de dez janelas de inovação. Avaliamos que este seria o momento, tendo em vista o sucesso durante a fase de testes e pesquisas com nossos consumidores — comenta Camila.

Produto artesanal

Atrair o público adolescente também foi o objetivo do CEO da gelateria Momo, Walter de Mattos, ao lançar no mês passado o Momo Frappé, com uma mistura de café expresso e gelato, disponível nos sabores Brigadetto e Caramelo Salgado.

Diferentemente das grandes redes, a proposta dele é oferecer ao público um produto artesanal, servido em taça de vidro, para que possa ser degustado com calma no próprio estabelecimento. O preço de venda é R$ 26.

Momo lança bebida inspirada em Starbucks, para conquistar jovens fãs da marca — Foto: Divulgação

— Esse produto foi muito divulgado pela Starbucks, um dos grandes êxitos da marca. Minha filha adolescente era uma grande consumidora. E, quando eu viajo, eu vejo jovens consumindo — conta Mattos. — A gente já tinha esse projeto na gaveta há um bom tempo, mas esse (a recuperação judicial da SouthRock Capital) foi mais um fator para lançarmos.

A Bendito, rede de cookies, brownies e cafés do Rio de Janeiro, tem notado maior frequência de clientes com menos de 20 anos desde novembro do ano passado, quando lançou o Iced de Chocoffe, feito de café expresso, chocolate, calda de chocolate e gelo, e o Cappuccino Shake, composto de expresso, leite condensado, leite batido com sorvete de baunilha e finalizado com cacau em pó.

A divulgação dos novos produtos foi feita tanto nas próprias lojas, quanto nas redes sociais.

Aposta na alta do faturamento

Com planos de investir em novas bebidas à base de café gelado, Bruno Gorodicht, diretor de novos negócios e sócio-fundador do Grupo Impettus, holding que detém as marcas Bendito, Espetto Carioca, Mané e Buteco Seu Rufino, espera que os lançamentos ajudem a aumentar o faturamento em até 10% neste ano.

Os novos itens, vendidos a preços entre R$ 16 e R$ 21, estão entre os dez produtos com melhor margem de lucro para a Bendito.

— Em nossas pesquisas de consumo, percebemos demanda por esse produto. Olhando a concorrência, a gente sabia que era a fortaleza da Starbucks. Acabamos pegando uma carona nessa onda de negatividade da Starbucks, surfamos nisso e foi positivo para gente — diz Gorodicht — A gente tinha público mais jovem indo com a família. Agora, eles vão sozinhos, vão entre dois e três amigos, ou compram para ir consumindo... coisas que não aconteciam antes.

Iced de Chocoffee, da Bendito, é vendido a R$ 16,90 — Foto: Divulgação

Força da marca

Apesar da ampla tentativa de filar a fatia de mercado da Starbucks no Brasil, o analista da Levante Investimentos, Gerson Brilhante, não acredita que as empresas terão êxito em ocupar o espaço da gigante do setor de café:

— A Starbucks é líder de market share no mundo todo (no segmento cafeterias), com quase 60%. No Brasil, com menor concorrência, mais ainda. Se usarmos como exemplo o McDonalds, é possível observar que não é uma marca muito grande no quesito café gelado. Não chegam perto da capacidade de oferta da Starbucks, nem do know how (expertise) em café gelado.

No exterior, a Starbucks não entrou em recuperação judicial e cresce a passos largos. Nos EUA, a segunda colocada no ranking de cafeterias é a Dunkin' Donuts, com 14,4% do mercado, bem atrás da líder, e em seguida vem a Keurig, com .

Brilhante ainda destaca que a companhia vem entregando bons resultados em outros países, com crescimento principalmente na China. Cerca de 73,5% da operação da rede americana estão concentrados nos Estados Unidos, enquanto 8,6% estão na China. A fatia é quase a mesma do que representa toda a América Latina (8%).

— Quando a pessoa vai comprar Starbucks, ela compra mais pela marca do que pelo produto. Mesmo que aumente em muito a oferta de café gelado no Brasil, não vejo isso como uma ameaça ao negócio (da rede americana) — opina.

Ainda assim, as redes apostam em novas bebidas geladas de café. A Bauducco acaba de lançar o Café Gelato Avelã, que inclui café com leite e creme de avelã; o Café Gelato Caramelo; e o clássico Affogato.

Denise Imamura, gerente executiva de marketing da Casa Bauducco avalia que as "novidades chegaram para completar o cardápio de cafeteria no momento certo".

Até em redes de fast food

O Bobs também lançou, ano passado, o Milk Café Shake, cuja embalagem de 500ml custa R$ 16,90. A diretora de marketing, Renata Brigatti Lange, diz que a marca optou pelo lançamento por estar "atenta aos movimentos do mercado e ao que o público deseja".

— O café faz parte da cultura e movimenta a economia brasileira. Somos o maior produtor de café do mundo e o segundo maior consumidor global da bebida, segundo pesquisas da Associação Brasileira da Indústria de Café — ressalta.

Ela continua:

—A preferência dos brasileiros de forma geral foi o grande motivador para unirmos nossa linha de Milk Shakes, que os consumidores adoram, com a tradicional bebida que está inserida em diversos momentos da rotina das pessoas.


Fonte: O GLOBO