Histórico inflacionário brasileiro deixa claro que taxa alta é ruim para a economia, para a sociedade e para a política

O ministro Fernando Haddad passou bem por uma série de embates na sessão da Comissão de Finanças e Tributação na Câmara, nesta quarta-feira. No entanto, ao falar que a meta da inflação é "exigentíssima" , "um negócio inimaginável" acabou alimentando dúvidas no mercado financeiro. A fala do ministro já teve reflexo em taxas de juros futuros e no dólar. E o que provocou essa reação? A declaração de Haddad pode levar à conclusão de que o governo não está comprometido com essa meta de 3% que permite uma taxa de até 4,5%. A inflação em doze meses está abaixo disso no momento.

— Os núcleos (da inflação) estão rodando abaixo da meta, que é exigentíssima... Uma meta, para um país com as condições do Brasil, de 3% de inflação, é um negócio inimaginável. Desde que o regime de metas foi instituído, quantas vezes o Brasil teve 3% de inflação? Em quantos anos isso aconteceu, nos 25 anos de regime de metas? — afirmou Haddad.

E eu sei que o ministro está comprometido com a inflação baixa, estabilizada, mas a sua frase deixa margem a uma interpretação do mercado financeiro de que ele está pensando em mudar a meta de inflação, afinal ele faz parte do comitê do Banco Central do Brasil que decide qual será a meta. É muito ruim quando o ministro da Fazenda deixa uma frase mal explicada.

Mudar a meta de inflação, diga-se de passagem, não resolve o problema. A meta hoje é de 3% com uma banda de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo. Ou seja, com essa taxa de flutuação, pode chegar a 4,5%. Se for elevada para 4%, isso significaria que a taxa poderia chegar a 5,5%, e aí começa a ficar uma inflação perigosa.

O Brasil tem uma longa história com a inflação alta e ela não é boa. Este ano se completam três décadas do Plano Real, que foi muito bem concebido e implementado, e livrou o país de 50 anos de superinflação e de um episódio traumático de hiperinflação.

Como jornalista de economia vivi tudo isso, escrevi sobre isso, inclusive um livro, o "Saga Brasileira". E a história mostra que no Brasil quando se chega a um determinado patamar de inflação ela rapidamente escala para dois dígitos. E quando chega nos dois dígitos, tem o risco de continuar subindo e provoca um mau humor completo em relação ao governo, perda de popularidade e de apoio, aconteceu no governo Dilma e no de Jair Bolsonaro.

No caso do governo Bolsonaro, para vencer a inflação de dois dígitos, a política econômica tomou medidas artificiais para baixar na marra a inflação. Isso deixou um custo muito alto para o governo Lula sobre o qual o ministro falou ontem. Um desses custos foi ter que compensar governadores que foram forçados a suspender o ICMS sobre combustíveis fósseis. Haddad pontuou isso na sessão da Câmara ao falar dos precatórios e do calote dos estados. Todos artifícios usados para conter a inflação com fins eleitoreiros, o que acabou não dando certo, porque ele não foi reeleito.

Mas a lição que ficou de vários episódios de índices mais altos é que inflação alta não é bom para a política, não é bom para o social, não é bom para a economia.


Fonte: O GLOBO