Para analistas, próximo passo é erradicar a pobreza, o que vai exigir avanços na educação e crescimento sustentável
Em 1993, 38,9% da população viviam na miséria. O primeiro golpe na pobreza extrema no país aconteceu há 30 anos, quando o Plano Real, implementado em 1994, conseguiu derrubar a inflação de maneira definitiva, com efeitos diretos na pobreza.
Em 1995, ela havia sido reduzida a 32% sem voltar a subir. Um fenômeno bem diferente do que ocorreu com os pacotes econômicos anteriores. No Plano Cruzado, em 1986, o indicador de miséria até caiu à metade, mas pouco tempo depois voltou aos patamares anteriores.
— O Plano Real fez a pobreza descer ladeira abaixo, caiu e não voltou. Um efeito inesperado. Mesmo com as crises asiática, russa e argentina (crises cambiais dos anos 1990), a pobreza continuou no mesmo patamar — afirma Marcelo Neri, pesquisador e diretor da FGV Social.
A estabilização da moeda — em um país no qual a população perdia poder de compra com uma inflação beirando 40% ao mês — deu mais potência às políticas de transferência de renda e de valorização do salário mínimo, já que preservava o rendimento dos brasileiros.
O aumento de 43% do piso salarial em 1995 e, nas décadas seguintes, a ampliação das transferências de renda e a continuidade da política de ganho real do mínimo derrubaram os índices para abaixo de 10%. Em 2023, o país tinha 8,3% em situação de miséria, pelos números de Neri, considerando como base rendimento domiciliar per capita de R$ 307.
Falta um último passo nesse avanço social que é erradicar a miséria até 2030, compromisso assumido pelo Brasil frente às Nações Unidas. E, lembra o economista Naercio Menezes Filho, professor do Insper, ainda há cerca de 20% a 25% da população na pobreza, com 150 milhões dos 203 milhões de brasileiros dependendo diretamente do salário mínimo, do Bolsa Família ou de ambos. Para resolver essa situação a agenda é extensa, mas conhecida, dizem os especialistas:
— Falta dinamismo na economia brasileira, há pouca inovação e produtividade para o país crescer de forma mais sustentada ao longo do tempo — diz Menezes Filho.
Efeito na desigualdade
O professor do Insper afirma que o país conseguiu vencer a inflação, avançar na parte social com o Bolsa Família, implantou o Sistema Único de Saúde (SUS ) e colocou as crianças na escola:
— Avançamos muito: nos anos 1980, até 1 ano de idade, morriam 70 crianças por mil nascidas. Esse número caiu para 14. Mas não abrimos a economia e mantivemos subsídios que são uma espécie de programa de transferência aos ricos.
Os gargalos estão mais ligados à baixa produtividade da economia, segundo o especialista, com empresas que adotam práticas gerenciais ultrapassadas e pouco inovadoras e uma educação que ensina pouco. A prova é a nota no Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos).
— Falta um Plano Real para educação. Fizemos políticas ótimas: o Plano Real, o SUS, o Bolsa Família, falta melhorar o aprendizado nas escolas. Nosso desafio para o futuro é fazer com que os nossos jovens aprendam matemática, ciência e leitura nas escolas. Elas ficaram fechadas dois anos e a nota (do Pisa) não se alterou, sinal de que não aprendem o suficiente para ter uma profissão digna — afirma Menezes Filho.
Neste mês, país ficou também entre os 15 piores em criatividade em teste do Pisa.
Para avançar ainda mais na direção da erradicação da pobreza, especialistas avaliam que o caminho é combater a desigualdade, já que o Brasil tem uma das piores distribuições de renda do mundo.
Há 30 anos, o controle da inflação teve impacto na redução da desigualdade. De acordo com cálculos de Neri, considerando o efeito isolado do fim do imposto inflacionário, os mais pobres tiveram ganho de renda de 11% nos 12 meses após a mudança da moeda. Já os mais ricos, que tentavam proteger seu poder aquisitivo com as contas remuneradas antes do Plano Real, tiveram ganho de 1%.
— Houve um efeito distributivo. O Plano Real gerou um boom na economia. Até hoje, nunca teve um ganho de renda tão intenso quanto o daquela época. De lá para cá, não houve. Mesmo sem computar o efeito inflacionário — afirma Neri.
Insegurança alimentar
Nos tempos atuais, a miséria está no menor patamar histórico, mas praticamente no mesmo nível desde 2014, quando atingia 9,6% da população e chegou a 8,3% em 2023.
— É um ponto presente no debate agora, essa derrocada da pobreza que começou no Plano Real, continuou até 2014, mas está em nível semelhante ao de 2014 — diz Neri.
Um ponto de atenção, na opinião do economista, é a insegurança alimentar, que não caiu na mesma proporção da miséria. Ainda está maior que em 2013.
— Foi uma agenda esquecida até alguns anos atrás, quando o Brasil voltou ao mapa da fome. Outra ação é fazer a inclusão produtiva dos mais pobres, com aumento da renda ao longo do tempo, políticas ligadas ao emprego formal e melhoria do ambiente para os pequenos negócios.
Carlos Melo, cientista político do Insper lembra que a efetividade das transferências de renda, que ganharam relevância nos governos petistas, só tiveram impacto tão forte na redução da pobreza pela estabilidade da moeda:
— Como fazer assistência social se no fim do mês o dinheiro se desvaloriza tanto? Foi uma mudança estrutural.
Fonte: O GLOBO
— O Plano Real fez a pobreza descer ladeira abaixo, caiu e não voltou. Um efeito inesperado. Mesmo com as crises asiática, russa e argentina (crises cambiais dos anos 1990), a pobreza continuou no mesmo patamar — afirma Marcelo Neri, pesquisador e diretor da FGV Social.
A estabilização da moeda — em um país no qual a população perdia poder de compra com uma inflação beirando 40% ao mês — deu mais potência às políticas de transferência de renda e de valorização do salário mínimo, já que preservava o rendimento dos brasileiros.
O aumento de 43% do piso salarial em 1995 e, nas décadas seguintes, a ampliação das transferências de renda e a continuidade da política de ganho real do mínimo derrubaram os índices para abaixo de 10%. Em 2023, o país tinha 8,3% em situação de miséria, pelos números de Neri, considerando como base rendimento domiciliar per capita de R$ 307.
Falta um último passo nesse avanço social que é erradicar a miséria até 2030, compromisso assumido pelo Brasil frente às Nações Unidas. E, lembra o economista Naercio Menezes Filho, professor do Insper, ainda há cerca de 20% a 25% da população na pobreza, com 150 milhões dos 203 milhões de brasileiros dependendo diretamente do salário mínimo, do Bolsa Família ou de ambos. Para resolver essa situação a agenda é extensa, mas conhecida, dizem os especialistas:
— Falta dinamismo na economia brasileira, há pouca inovação e produtividade para o país crescer de forma mais sustentada ao longo do tempo — diz Menezes Filho.
Efeito na desigualdade
O professor do Insper afirma que o país conseguiu vencer a inflação, avançar na parte social com o Bolsa Família, implantou o Sistema Único de Saúde (SUS ) e colocou as crianças na escola:
— Avançamos muito: nos anos 1980, até 1 ano de idade, morriam 70 crianças por mil nascidas. Esse número caiu para 14. Mas não abrimos a economia e mantivemos subsídios que são uma espécie de programa de transferência aos ricos.
Os gargalos estão mais ligados à baixa produtividade da economia, segundo o especialista, com empresas que adotam práticas gerenciais ultrapassadas e pouco inovadoras e uma educação que ensina pouco. A prova é a nota no Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos).
— Falta um Plano Real para educação. Fizemos políticas ótimas: o Plano Real, o SUS, o Bolsa Família, falta melhorar o aprendizado nas escolas. Nosso desafio para o futuro é fazer com que os nossos jovens aprendam matemática, ciência e leitura nas escolas. Elas ficaram fechadas dois anos e a nota (do Pisa) não se alterou, sinal de que não aprendem o suficiente para ter uma profissão digna — afirma Menezes Filho.
Neste mês, país ficou também entre os 15 piores em criatividade em teste do Pisa.
Para avançar ainda mais na direção da erradicação da pobreza, especialistas avaliam que o caminho é combater a desigualdade, já que o Brasil tem uma das piores distribuições de renda do mundo.
Há 30 anos, o controle da inflação teve impacto na redução da desigualdade. De acordo com cálculos de Neri, considerando o efeito isolado do fim do imposto inflacionário, os mais pobres tiveram ganho de renda de 11% nos 12 meses após a mudança da moeda. Já os mais ricos, que tentavam proteger seu poder aquisitivo com as contas remuneradas antes do Plano Real, tiveram ganho de 1%.
— Houve um efeito distributivo. O Plano Real gerou um boom na economia. Até hoje, nunca teve um ganho de renda tão intenso quanto o daquela época. De lá para cá, não houve. Mesmo sem computar o efeito inflacionário — afirma Neri.
Insegurança alimentar
Nos tempos atuais, a miséria está no menor patamar histórico, mas praticamente no mesmo nível desde 2014, quando atingia 9,6% da população e chegou a 8,3% em 2023.
— É um ponto presente no debate agora, essa derrocada da pobreza que começou no Plano Real, continuou até 2014, mas está em nível semelhante ao de 2014 — diz Neri.
Um ponto de atenção, na opinião do economista, é a insegurança alimentar, que não caiu na mesma proporção da miséria. Ainda está maior que em 2013.
— Foi uma agenda esquecida até alguns anos atrás, quando o Brasil voltou ao mapa da fome. Outra ação é fazer a inclusão produtiva dos mais pobres, com aumento da renda ao longo do tempo, políticas ligadas ao emprego formal e melhoria do ambiente para os pequenos negócios.
Carlos Melo, cientista político do Insper lembra que a efetividade das transferências de renda, que ganharam relevância nos governos petistas, só tiveram impacto tão forte na redução da pobreza pela estabilidade da moeda:
— Como fazer assistência social se no fim do mês o dinheiro se desvaloriza tanto? Foi uma mudança estrutural.
Fonte: O GLOBO
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