Pequim considera a ilha de governo autônomo como parte de seu território e nunca renunciou ao uso da força para tomar seu controle; EUA são principal apoio internacional de Taipé

A China anunciou nesta quarta-feira que suspendeu as negociações com os Estados Unidos sobre o controle e não proliferação de armas nucleares em resposta às vendas de armas dos americanos à ilha de Taiwan. Washington e Pequim realizaram em novembro discussões incomuns sobre esta questão como parte de uma estratégia para melhorar as relações entre os dois países antes de uma cúpula com os respectivos presidentes, Joe Biden e Xi Jinping.

Desde então, porém, não foram anunciadas novas discussões — e, segundo um responsável da Casa Branca afirmou em janeiro, a China não havia respondido às suas propostas sobre “redução de riscos”. Como justificativa, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores chinês, Lian Jian, disse que “os EUA continuam suas vendas de armas a Taiwan e empreendem uma série de ações negativas que prejudicam gravemente os interesses centrais da China, minando a confiança política mútua”.

A China considera Taiwan, ilha de governo autônomo, como parte de seu território e nunca renunciou ao uso da força para tomar seu controle. Embora tenha mudado seu reconhecimento diplomático de Taipé para Pequim em 1979, os Estados Unidos permanecem como o principal apoio internacional de Taiwan, além de seu maior fornecedor de armas. Em abril, o Senado americano aprovou um pacote de ajuda militar de US$ 8,1 bilhões (R$43,9 bilhões) para a ilha.

Em relatório apresentado ao Congresso em outubro, o Pentágono advertiu que Pequim estava desenvolvendo seu arsenal nuclear mais rapidamente do que os EUA antecipavam. Em maio do último ano, a China dispunha de mais de 500 ogivas nucleares operacionais, segundo a Defesa americana, que previu que esse número chegaria a mais de mil em 2030. O Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo (Sipri) estima que a China possui 410 ogivas nucleares, longe das 3,7 mil dos Estados Unidos e das quase 4,5 mil da Rússia.

Investimento avança

Em janeiro de 2022, Estados Unidos, França, Reino Unido e China concordaram, segundo expressado num comunicado conjunto, que “uma guerra nuclear não pode ser vencida e nunca deve ser travada”. Um mês depois, no entanto, o Exército russo invadiu a Ucrânia, quebrando o consenso sobre o uso desse tipo de arma. Desde então, o perigo de que algum líder recorra ao botão nuclear em algum dos conflitos ativos fez com que as potências nucleares modernizassem seus arsenais num contexto em que cada vez mais se exibe o inventário.

Potências internacionais aumentam gastos em armas nucleares; investimento em todo o mundo aumentou US$ 10,8 bilhões em 2023 em relação ao ano anterior — Foto: SIPRI/Editoria de Arte

Este foi o panorama descrito no relatório anual do Sipri, publicado no último mês, que analisou as tendências dos noves países com arsenal atômico. O número total de ogivas nucleares prontas para uso no mundo, diz o documento, continua subindo, em parte por causa do impulso chinês. O caso chinês é um bom exemplo para mostrar o alto grau de tensão entre as potências atômicas nos últimos meses. Segundo o relatório, as armas nucleares não desempenhavam um papel “tão destacado nas relações internacionais” desde a Guerra Fria.

O crescimento se explica principalmente pela probabilidade de que a China considere que seu arsenal já não tem o peso suficiente em comparação com outras potências, segundo a análise de Matt Korda, pesquisador de armas atômicas do Sipri. Para ele, há algumas décadas, Pequim podia até estar satisfeita com “apenas 200 ogivas nucleares”, mas agora vê que Washington e Moscou construíram defesas avançadas contra mísseis e que têm capacidades cada vez mais efetivas, com potencial inclusive para eliminar as suas armas.

Apenas 19 dias após assumir o poder, em 2012, Xi reuniu os generais que supervisionavam os mísseis nucleares do país e disse que a força desse arsenal era um “pilar de nosso status como grande potência”. Já naquela época ele afirmou, em discurso a portas fechadas, que os generais deveriam ter “planos estratégicos para responder sob as condições mais complicadas e difíceis à intervenção militar de um inimigo poderoso”, e refletiu o temor de que o “modesto” armamento nuclear da China pudesse ser vulnerável contra os EUA. (Com AFP, El País e NYT)


Fonte: O GLOBO