Número de homicídios dobrou, enquanto as mortes decorrentes de intervenção policial saltaram de 8 para 40 no período
Depois de presenciar um arrastão na virada do ano em Guarujá (SP), a turista Erivânia Gonçalves prometeu nunca mais voltar na alta temporada. A jovem Manoelle Moreno só frequenta a orla da cidade com a família com uma condição: levar um único celular, para reduzir a chance de roubo.
A vendedora de roupas Joyce Moraes opta por esconder o aparelho, dinheiro e documentos na cintura, e só usa bijuterias prateadas, menos atraentes para os bandidos que as cor de ouro. Uma atendente de um quiosque na Praia da Enseada alerta todos clientes que chegam de que ali é um ponto recorrente de assalto.
Antes chamado de Pérola do Atlântico, o Guarujá é reconhecido não mais pelas belezas naturais, mas pela violência urbana. A cidade continua com vários indicadores criminais em alta um ano depois da controversa Operação Escudo, que deixou um saldo total de 105 mortes. O número de homicídios passou de 17 para 34 (acréscimo de 100%) e de mortes decorrentes de intervenção policial, de 8 para 40 (400%). Em contrapartida, caíram o latrocínio (-100%, de 1 para zero), o roubo (-22%) e o furto (-4%).
Antes chamado de Pérola do Atlântico, o Guarujá é reconhecido não mais pelas belezas naturais, mas pela violência urbana. A cidade continua com vários indicadores criminais em alta um ano depois da controversa Operação Escudo, que deixou um saldo total de 105 mortes. O número de homicídios passou de 17 para 34 (acréscimo de 100%) e de mortes decorrentes de intervenção policial, de 8 para 40 (400%). Em contrapartida, caíram o latrocínio (-100%, de 1 para zero), o roubo (-22%) e o furto (-4%).
Guarujá na mira — Foto: Editoria de Arte
Os dados são um comparativo entre os 11 meses após o início da operação, em julho passado, com o mesmo período anterior, feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a pedido do GLOBO, com base em indicadores da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo.
A violência contribui para a desvalorização do preço médio dos imóveis. O preço do metro quadrado em Guarujá aumenta num ritmo mais lento do que em outras cidades litorâneas, segundo o economista Rodger Campos, fundador e consultor da RBA Consultoria Econômica. Passou de R$ 5.767, em junho de 2023, antes da Operação Escudo, para R$ 6.172, em junho, uma variação de 7%. Em Santos, o aumento foi de 11% no mesmo período. Na Praia Grande, de 10%.
— A valorização está relacionada tanto à infraestrutura do imóvel quanto à oferta de bens públicos. Fatores negativos, como crime e trânsito nas cidades, puxam o preço (para baixo) — explicou Campos.
Tiros na praia
Uma das mais belas do Guarujá, a Praia de Pernambuco é cercada de condomínios de alto padrão e seguranças que acompanham os moradores até a areia. Uma trilha acessível na maré baixa leva a uma ilha. Manoelle Moreno, de 15 anos, estava com a mãe e o filho de meses vendendo açaí na praia em fevereiro quando um grupo pediu informações sobre a trilha. A jovem alertou que assaltos a turistas eram comuns no percurso. Eles foram assim mesmo — e acabaram roubados e agredidos. A PM trocou tiros com os assaltantes, todos menores de idade.
Roubo de celular continua em alta na Baixada — Foto: Maria Isabel Oliveira /Agência O Globo
— Todo mundo correu. A praia ficou vazia. Até que eles se entregaram — conta. — (A ilha) é um lugar muito bonito. As pessoas vão tirar fotos. Mas voltam sem celular.
Uma atendente de um quiosque na Praia da Enseada, que preferiu não se identificar, conta que vê até quatro assaltos por dia na alta temporada. Em geral menores, os ladrões têm preferência, conta, por joias e celulares, e costumam se sentar nas cadeiras da praia para fingirem que também são turistas.
— Eles chegam de bike, e nunca vêm sozinhos. Eu aviso os clientes para tirar corrente de ouro, aliança, Mas alguns ainda acham ruim. Para a gente é péssimo, espanta os fregueses — lamenta.
A dona de casa Erivânia Gonçalves, de 41 anos, estava na praia na festa do réveillon deste ano quando foi surpreendida por um grupo de uns 15 garotos que faziam um arrastão. Moradora da Zona Sul de São Paulo, ela afirma que se sente mais segura na capital.
— Foi na queima de fogos. Era um bando de jovens, que ficavam na beira do mar escolhendo a vítima que estava pulando ondas. Foi uma coisa de louco — recorda.
Manoelle (ao centro) e a família levam apenas um celular quando vão à praia, por medo — Foto: Maria Isabel Oliveira
Há cerca de um mês, a vendedora Joyce Moraes, de 41 anos, foi seguida por menores de bicicleta quando voltava do trabalho. Entrou em uma loja de conveniência para escapar do roubo. Depois disso, evita andar sozinha à noite, não guarda nada de valor na bolsa e não usa nenhum adorno dourado.
— O grande problema são os trombadinhas. A gente até sabe quem são eles. Quando vê, já desvia — diz.
Recentemente, roubos de celulares fizeram a Polícia Civil investigar lojas de venda e conserto de aparelhos em Guarujá. Na semana passada, uma operação foi feita em quatro endereços. Em uma das lojas, os agentes apreenderam 74 celulares sem procedência definida ou ordens de serviços para conserto ou manutenção, além de peças usadas de telefones sem identificação. Um deles, um Samsung modelo S22, havia sido roubado em Bertioga.
A proximidade do Guarujá com o Porto de Santos, o maior do Brasil, ajuda no escoamento de cocaína para o exterior. As comunidades em mangues e morros de difícil acesso favorecem as fugas dos criminosos e a camuflagem da droga. Com isso, a antiga Pérola do Atlântico ganhou um novo apelido de policiais que atuam na região: “Meca do Narcotráfico”.
— Em torno dessa criminalidade organizada sempre vão crescer outras — diz o delegado Rubens Barazal Teixeira, da seccional de Santos.
(colaborou Rafael Garcia)
Fonte: O GLOBO
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