Com 12 milhões de seguidores apenas no Instagram, ex-coach publicou nada menos do que 29 vídeos na plataforma

Ricardo Nunes (MDB), Pablo Marçal (PRTB), Tabata Amaral (PSB), José Luiz Datena (PSDB) e Guilherme Boulos (PSOL) — Foto: FELIPE MARQUES/ZIMEL PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO; RENATO GIZZI/AGÊNCIA O DIA/ESTADÃO CONTEÚDO

O confronto entre os candidatos à prefeitura de São Paulo continuou nas redes sociais após o término do debate na Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP), organizado em parceira com o jornal Estado de S. Paulo e o Terra, na manhã de ontem. A estratégia de viralizar “cortes” (vídeos curtos) das falas, priorizando frases de efeito e “memes”, foi usada por praticamente todos os concorrentes, com vantagem em termos de alcance e engajamento para o empresário Pablo Marçal (PRTB) — o que gerou cobranças nos bastidores da campanha do prefeito Ricardo Nunes (MDB).

Com 12 milhões de seguidores apenas no Instagram, Marçal publicou nada menos do que 29 vídeos na plataforma até as 16h, três horas após o fim do debate. A rede não divulga a audiência de cada postagem, mas é possível avaliar o engajamento pelo número de likes. O candidato teve mais de 4,3 milhões de curtidas em um período de seis horas contadas a partir do início do evento, 38 vezes mais do que os outros quatro candidatos somados — além de Nunes, participaram Guilherme Boulos (PSOL), José Luiz Datena (PSDB) e Tabata Amaral (PSB).

A prática não é nova para o ex-coach: reportagem do GLOBO em junho revelou um esquema de pagamentos a seguidores em troca dos cortes, ação que virou objeto de representação da campanha de Tabata no Ministério Público por suposto abuso de poder econômico.

Para efeitos de comparação entre os que lideram as pesquisas, Boulos publicou cinco postagens relacionadas ao debate, contra quatro de Nunes e de Tabata. Datena fez três publicações, enquanto a economista Marina Helena (Novo) apresentou apenas um conteúdo relacionado ao evento. Juntos, todos tiveram 110 mil curtidas.

A estratégia do candidato provocou reações nos bastidores da campanha de Nunes, que concorre com o ex-coach pelo voto bolsonarista em São Paulo. Caciques do PL em Brasília avaliaram que faltou agilidade e volume nas postagens do prefeito após o debate. O GLOBO apurou que a campanha paulistana passou a ser, inclusive, pressionada a reforçar a equipe que lida com os “cortes”. Entre os aliados de Nunes, porém, ainda falta consenso sobre a estratégia de embarcar de vez na guerra cibernética.

Discurso e prática

Antes e depois do confronto, candidatos disseram que queriam fazer um debate propositivo e não baixar o nível. Mas, na prática, quase todos usaram seus perfis e entrevistas para ironizar ou atacar os adversários. Nunes, que tem buscado passar uma imagem de moderação na campanha, falou que é preciso “discutir a cidade” em vez de ter “um show de cortes na rede social”.

— As pessoas não estão vindo para debater. As pessoas estão vindo para fazer recorte de vídeo. A gente precisa tratar da cidade real, não da rede social — afirmou a jornalistas.

Presencialmente, o prefeito manteve a estratégia de fugir de polêmicas e dar destaque a ações do governo, mas partiu para o ataque no mundo virtual. Em um dos posts, Nunes ironizou Tabata — um corte de vídeo no qual diz que ela “tem ido muito a outros estados”. Em outro, fez um recorte cômico atacando Datena — na legenda, usou o termo “Da pena” e, no vídeo, trouxe montagens do rival gaguejando, além de incluir um trecho do apresentador de olhos fechados no debate com a música “Ursinho Pimpão”, do Balão Mágico, ao fundo.

“Esse é o candidato à prefeitura, intitulado professor e que na prática não mostra bom comportamento em suas causas”, escreveu o prefeito em outra publicação, que ataca o histórico de Boulos como líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST).

O psolista, por sua vez, criticou a postura de Marçal no debate, afirmando que ele veio “para tumultuar” e que faz isso “porque dá ibope e ganha destaque do algoritmo das redes sociais”. Ao mesmo tempo, provocou o empresário ao dizer que ele não deveria estar ali porque sua condenação foi comprovada, e ainda assim ele não retirou sua candidatura como havia prometido. Boulos também justificou o momento em que tentou dar um tapa numa carteira de trabalho que Marçal insistiu em mostrar diante dele:

— Quando uma pessoa vem na tua frente, mente de maneira descarada, te ataca, te provoca, ninguém tem sangue de barata. Você precisa ter o mínimo de indignação.

O deputado federal, porém, também aproveitou as redes para explorar assuntos polêmicos. Nos stories, o deputado republicou uma condenação de Marçal por furto qualificado em Goiás, em 2010, e lembrou o episódio em que Nunes foi flagrado por policiais empunhando uma pistola calibre .38 na frente de uma casa noturna em Embu das Artes, em 1996. Foram ouvidos tiros no local, mas, na época, o prefeito negou que tenha sido o autor do disparo.

'Rouba, mas não faz'

Em outro post pós-debate, Tabata — que se apresenta como mais propositiva e avessa a polêmicas — balança a cabeça negativamente enquanto Boulos e Marçal discutiam do seu lado. O material associa os adversários ao termo “briga” e reserva a ela a palavra “propostas”. Em outra publicação, a candidata recorta um trecho do debate em que sugere um novo slogan a Nunes: o “rouba e não faz” (alusão ao ex-prefeito Paulo Maluf, apelidado de “rouba, mas faz”). O comentário foi considerado ofensa pessoal e gerou direito de resposta ao prefeito no debate.

Pivô dos momentos mais agressivos, Marçal disse a jornalistas que o evento foi um “embate” e que queria apresentar propostas, mas não é possível porque os adversários iriam “armados”.

— Se propuser ir num debate, eu vou debater com o maior prazer. Aqui é baixaria mesmo, eles vão ter que aguentar. Nosso povo colocou esse tipo de política, e a gente vai tirar agora. Estou de saco cheio desses politiqueiros vagabundos — declarou.

Sua artilharia nas redes foi pesada, com dezenas de cortes, explorando principalmente o confronto com Boulos. Em um dos posts, disse que o adversário não conseguiu pegar a carteira de trabalho porque ele é um “ultraman”, em referência à competição de triatlo.

Cobrado por seu desempenho no debate da Band e pelo distanciamento do programa de governo, Datena reclamou que não se tem como apresentar propostas em meio ao cenário de “baderna” e de “briga de rua” no evento. Ele se manteve coerente no material distribuído depois nas redes, mas teve o menor alcance entre todos os candidatos.

(Colaborou: equipe da sucursal de Brasília)


Fonte: O GLOBO