Jornalista mostra a devastação causada pelo fogo que encontrou nos dois lados da estrada em que viaja pela região

"A chegada ao Pantanal Mato-Grossense na terça-feira para cobrir os efeitos da queimada que assola o bioma desde junho acabou antecipada para nós pela fumaça. O voo da Azul que levava a mim e a fotojornalista Márcia Foletto para Corumbá teve de aterrissar em Bonito, devido às colunas de fuligem que estão prejudicando o tráfego aéreo. Tivemos de continuar nossa jornada até Corumbá, conhecida como capital do Pantanal, pela BR-262.

Só o que cai do céu no Pantanal são cinzas. Nem uma gota d’água. A fumaça funde a terra, as pessoas, as casas, a vegetação, numa única paisagem ocre, da cor das brasas. O fogo que se intensificou há uma semana na região dos municípios de Miranda e de Aquidauana se alastrou, levado pelo vento forte e temperatura à beira dos 40°C.

Em Salobra, um incêndio bloqueou os dois lados da única estrada. Uma longa fila de caminhões, ônibus e carros aguardava a Polícia Rodoviária Federal liberar a estrada noite adentro.

As colunas de muitos focos de fogo se unem numa só nuvem, que se ergue do solo e engole o sol. A fumaça onipresente consome a paisagem e cria um cenário como os que se vê em filmes apocalípticos.

Onça carbonizada

Aos animais, as maiores vítimas, só resta fugir. Tucanos-do-bico-amarelo se refugiam nos galhos secos de uma piúva, o nome pantaneiro do ipê rosa. Moradores contam que uma onça pintada não teve tanta sorte. Cercada pelas chamas, morreu carbonizada.

A intensificação do fogo levou ao desespero no fim de semana a bióloga Neiva Guedes, conhecida mundialmente por salvar as araras-azuis da beira da extinção. Guedes precisou retirar sua equipe de campo porque já não havia mais condições de segurança. Ela não sabia se as araras poderiam escapar. Segundo ela, em alguns lugares a situação já está pior do que em 2020.

Na raiz de todos os males está o calor seco que não cede. A esperança é que a frente fria prevista para a madrugada de quinta-feira traga alívio e apague focos, não deixando outros se espalharem."

*Repórter especial do GLOBO. As jornalistas viajam a convite do Projeto GEF Terrestre


Fonte: O GLOBO